quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

A fada enclausurada na lembrança



Gritou para o mundo sobre a paixão incendiada. No entanto, guardou todos os impropérios que poderia sussurrar em seu ouvido ou todas as juras de amor que vibravam em seu coração. Sem energia alguma, só queria pedir para que ficasse, que olhasse em seus olhos e dissesse que era de verdade. 

Em seus abraços sentiu que o mundo inteiro poderia desaparecer, que a música era infinita e todos os pássaros ressoariam suas emoções em forma de canto. Conseguia saber, de outra forma, o que era sentir com plenitude novamente. Porque todos os céus brilhavam dentro de si, porque rimar fazia sentido outra vez. 

Depois, vieram todos os escárnios, toda a repúdia em formato de discurso, todos os olhares menores. Depois, não sabia como prosseguir neste Universo tão cruel, no qual a sua presença não é infinita. Nesta realidade que ela não faz parte, tudo é amargo, o sol desaparece, a luz se apaga.

Em seguida, finge. Disfarça para que possa seguir. Desfaz seu nome da memória, queima a recordação do seu sorriso, deleta o som da sua voz em sua lembrança. E não consegue compreender a dimensão desta emoção injustificada. Para além de suas qualidades, não há história de verdade. É uma narrativa ficcional, que somente as cartas corroboram. 

Por qual razão se prende neste fábula ilusória em decomposição? Talvez esteja certa. Talvez, vá demorar sim. Em cada amanhecer jura que não irá pensar em sua face resplandecente e retorna para o estágio inicial. Ao dormir, sonha com sua presença iluminada. Em cada passo ou acontecimento, quer dividir o sabor de viver plenamente. 

Todavia, não pode. A jornada, esta que fora partilhada, se encerrou. Agora, é necessário abandonar os devaneios de outrora. Todes ao seu redor gritam, em uníssono, que chegou a hora de pular em outros abismos, de prosseguir. Todos os muros foram escalados, todas as sentenças foram proferidas.

Então, por que não consegue se desvencilhar desta ficção mal construída? Por que olha para as cartas e sabe que é sobre ela? Por que pergunta? Por que ainda espera? Não há aguardo mais cruel do que o da fantasia tripudiada. Não existe calma que consiga dar conta dos desejos de uma tola apaixonada. 

No entanto, se é o desespero que a consome, é nele que irá se banhar. O prazo de tal sensação é imprevisível. Mas, a demora é verdadeira. E, olha só, ela está certa de novo! Porque é de certezas que a outra faz sua estrada e não de promessas. 

Por isso, segue. Ou tenta. Caminhar é a única resposta ou salvação. Vai esperar que o próximo ano chegue e, com ele, todas as soluções podem brotar dentro do espaço infinito das horas. Até lá, deixa que a revoada de borboletas domine a aura. Até lá, se banha de esperança. Ainda há tanto por vir…

terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Grão derramado


 Com todas as verdades anunciadas, viu o céu desabar em suas mãos. No confinamento de sua torre improvisada, deixou que o pranto escorresse cristalino. Com o coração apertado e ainda mais estilhaçado, respirou fundo e seguiu seus passos em direção do novo. Agora, com os olhos verdadeiramente abertos, renuncia o desejo e sela um beijo com o caos. Se todos os pedidos foram entregues, não há rumo algum que possa tomar sozinha.

Dentro do medo, há sempre um mistério para ser desvendado. Inserida na fuga, não poderá jamais habitar o seu jardim florescido. Vestida de coragem, esta que corre em suas veias, gostaria de emprestar um pouco de si para a outra. Suspirando em demasia, roga por respostas um tanto imediatas. É porque a exaustão tomou conta de sua aura e todas as suas energias foram sugadas nesta batalha com o invisível.

Fitando a sua imagem verdadeira, reconheceu nela o que mora também em sua alma. Vendo o espaço entre elas aumentar, gradativamente, sentiu o chão se abrir e a razão se esvair descompassadamente. Cada passo para um futuro separado era como uma martelada certeira. Perdida e sozinha, procurou afago nos goles intensos, em cálices profundos, de venenos legalizados. Sorveu em desespero o líquido adocicado, enquanto barrava o choro insistente.

Depois, decidiu abandonar a canção e escutar tão somente o silêncio. Em sua cela colorida, deixou que o vendaval passasse e cortou as palavras lancinantes que queriam sair de sua boca. Preferiu guardar, com muito cuidado e com cadeados múltiplos, toda a emoção presente dentro dela. Após seus olhos conferirem tanto desprezo, como regressar para o ponto inicial? Como confiar na certeza de suas intenções? Como ser inteira ao formular frases?

No entanto, há de haver uma jornada outra, esperando para ser iniciada. Há de existir um recomeço reconfigurado, escondido em algum lugar do destino. Todavia, deixa que o mundo gire e complete as suas voltas eternas. Deixa que o Tempo lhe conte qual será o papel dela em sua caminhada. Ou, até, se haverá algum espaço possível. Assim, não mais teme um novo encontro. Assim, não cria ressentimentos, amarguras ou dissolve a lealdade. Pelo contrário, é leal sem precisar de nada em troca.

Ainda assim, espera a sua decisão, pois a chave está lá, nas suas terras, nas suas mãos. Ela que é dona de todas as sentenças ideais, do horizonte radiante, dos sorrisos doces, dos olhares verdadeiros, ela retém em suas mãos este objeto glorificado. Sim, somente ela pode resetar ou prosseguir com qualquer história. Entre flâmulas e ar, trará consigo o que for de sua vontade, pois do outro lado não existem pedidos, cobranças ou desejos insensatos. Então, se quiser (e puder), venha.  

quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Alívio




Pisou em terra firme e soube que todos os sonhos eram possíveis. Diante de todos os desafios propostos, em um ano tão surrealmente atípico, venceu cada batalha travada com o destino. Entre aventuras singelas, trabalhos hercúleos, encontros e desencontros, foi fiel aos seus desejos. 

O horizonte parecia nublado no passado, mas é no aqui e agora que se fazem as certezas. Todos os elementos se encaixam quando é necessário. Todos os pedidos rogados aos céus são atendidos, mas de sua própria maneira. Não importa o que as cartas dizem, o que o vento propaga, porque foi ela que escalou a alvorada de pó e gritou para o mundo que estava ali. 

As subidas e descidas foram incontáveis. Entre os desamores costumeiros e os novos, sorriu aliviada, pois realizou tudo que sua vontade mandou. Assim foi também com os labores. Estes que preencheram seu coração de esperança para o que está por vir.

Talvez, a sua escrita esteja banhada de uma esperança boba e de fantasias descompensadas. Contudo, não se importa mais. Em cada silêncio, uma nova canção surge. Em cada janela fechada, um outro projeto. Por que então derramar lágrimas e viver de lamúrias? 

Não. Dessa vez, vai se prender aos bons abraços, nas gargalhadas da madrugada e, até, no beijo inesperado em seu fiel escudeiro. É para isso que ela existe: para as surpresas, para as intensidades, para a dedicação profunda. Nunca pela metade.

Inteira, segue. O que virá ainda é mistério, mas não precisa mais de ansiedade alguma, porque ela jamais sabe o que estará na próxima esquina. Então, por que tentar adivinhar? Que venha. Ou não. Respira e contempla o céu mais azul de todos! 

segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

Luar



Nos sonhos urgentes, vislumbra cenas intensas. Na memória pulsante, tenta resgatar cada sorriso imediato. No amanhecer, apaga seu nome do coração e segue por novos rumos. Todavia, ao adormecer, ela chega e vem em sua mente, ocupando todo o espaço. Como controlar o subconsciente que revela tantas verdades? 

Nas bifurcações trazidas pelo destino, é necessário respirar fundo e ter certeza de que não irá adentrar na trilha mais perigosa. No entanto, falha em acertar todos os caminhos corretos. Entre neblinas, sombras e florestas incendiadas, busca fugir ou gerenciar os medos e desejos. 

Contudo, é incapaz de guardar seus sentimentos. Eles explodem e fazem uma revoada, que espalha para todos os cantos as emoções afloradas. Não quer dizer tanto ou se pronunciar tanto. Quer estar presente, mas desaparecer por alguns segundos. 

Ainda assim, sabe que se lutou tanto, por tantos meses, e que cada segundo valeu se, ao fim, pode pisar no mesmo chão, avistar o mesmo céu e fitar os seus olhos profundamente encantadores. Aqueles olhos castanhos tão intensos e cheios de verdade. 

Há também o seu sorriso, que faz a aura brilhar e sinfonias inteiras soarem somente por ele. Existe algo extremamente encantador em pessoas de sorrisos sinceros e olhares flamejantes. Mas, não são apenas estes elementos que trouxeram o enamoramento. 

São muitos. Incontáveis. Infinitos. Mas, os guarda agora somente para si. Quando os solos forem distintos, retornará para a sanidade e fingirá que esta paixão nunca existiu. Irá enterrar no fundo do peito todos os desejos candentes desperdiçados. 

E não é triste o final desta canção. É, tão somente, verdadeiro e sensato, assim como ela. 

sábado, 18 de dezembro de 2021

Despertar da fantasia




Os céus desabaram e rimaram com seu coração. Num descompasso lancinante, queria fugir para sua torre secreta, mas não era possível. Em outras terras, precisou encarar e escutar a certeza do não, sem que ao menos houvesse um sim. 

Do outro lado, uma beleza radiante e um sorriso desconcertado. Ela, que é dona de toda chama que habita o mundo, olhou nos seus olhos e eles eram somente negação. Depois, uma lista de impossibilidades, um vendaval em forma de discurso. 

O chão se abriu e caiu em múltiplas dimensões, que se chocavam. Há aquela que criou e fantasiou tolamente, por meses. Existe também a real, dura e profundamente certeira. Foi então que a tontura se instalou e partiu em direção de algum aconchego menos traumatizante. 

Agora, pelo menos sabe que tentou, que lutou até o fim, mesmo que tenha sido pela fantasia e não pela realidade. Agora, respira fundo, abre os olhos e procura novos rumos, outras estradas. Sorri enquanto escreve, porque as memórias ficaram e o sol há de vir. 

Com canções ou não, pisará firme e seguirá na trajetória tão sonhada. É isso que sabe fazer de melhor, não? Jornadas infinitas de trabalho, afazeres, que deixam o tempo escorrer das suas mãos e tudo é mais feliz quando está imersa neste seu mundo particular de labor. 

Todavia, será árduo esquecer do som da sua voz, da sua boca, das suas mãos, do seu jeito e, agora, do seu cheiro. Recordará, em um futuro não tão distante, de tudo que poderia ter sido e não foi. Mas, é na paciência exercida que se curam as paixões desmedidas anunciadas em cartas de tarô. 

Sempre.


terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Quando a fada resgatou o outrora



Ela veio de uma coleção de pó de estrelas encantado, daqueles efervescentes, que brilham infinitamente. A sua intensidade leviana é avassaladora. Nela, ela carrega todas que passam por seu caminho e chacoalha seus mundos, em busca de um prazer momentâneo, porém que marca para a eternidade. Nunca pela metade, ela sorve cada sabor de conquista e ressignifica as derrotas. Sim, ela é ventania que se alastra e derrama os cálices resplandecentes, com um sorriso.

Depois, guarda consigo cada recordação das migalhas que restaram, após o vendaval. Entre flâmulas e oceanos, roga ao destino que seu coração se aquiete. Prestes a cometer mais um de seus atos impensados, recalcula a rota, procurando não repetir padrões de um outrora incendiado. Aquela que iluminou seus dias cinzas e deitou em cima da cama de rosas, já não consegue mais subir no balanço e performar ingenuidade. "As estações agora mudaram". 

Todavia, os anos se passaram e as dores permaneceram as mesmas, assim como os padrões. Se não pode colher as flores e observar os anjos escorrendo pelas paredes, por que repetir os passos iguais, em direção da mesma sina? Quantas sonatas terão de tocar até que possa ver nitidamente as mazelas de suas decisões? Qual é a verdade de seus sentimentos e por qual razão insiste em falar do mesmo assunto? Não existe mais jardim, tampouco varanda. Não há mais fumaça mentolada que caiba em seu peito.

No entanto, talvez, no agora de exaustão, o que deseje seja encontrar caminhos, voltando lá na vida pregressa, quando os pássaros mortos cantavam e anunciavam um novo amanhecer. Pois, a solidão insuportável lhe trazia rumos desmedidos, conflituosos, desgastantes, porém decisões eram feitas. Seguia, pela emoção, pela mera sensação de entretenimento, pela premissa intensa, pela determinação tola. Neste rumo, pagava altos custos por sua obstinação.

E nunca cessou. A cada música que aquecia a aura, partia bravamente em busca de um horizonte fiel. Sem louvor, continuava a procurar. Mas, em um dado momento, construiu seu próprio muro, abandou os donos do escárnio e deitou em sua cela particular. Sem rodas gigantes, sem amores pintados nos muros, sem acreditar numa possível reviravolta. 

De repente, chegou. Chegaram. Vieram para, logo em seguida, partirem. Velozes, cheias de sentenças prontas e turbulências. Com elas, todas elas, era como se estivesse sempre em um avião, rezando para chegar em terra firme. Ainda assim, fechou os olhos para a verdade e se deixou levar outra vez. "Mais uma. Somente esta canção e paro de vez", pensou. E é por isso que embarca, novamente. Porque  existe somente algo inabalável em sua jornada: a fidelidade ao ser quem é. De verdade. Para todo sempre. E quem sabe o que este vendaval irá afetar desta vez? Sigamos.

sábado, 27 de novembro de 2021

Donnerstags


 

A coragem sempre a acompanhou. Em cada passo, nunca deixou de desaguar as palavras que moravam em seu peito. Em todos os abismos, pulou, sem certeza alguma. No hoje, ensolarado e cheio de recordações, tem certeza de que os erros e acertos do passado vieram para que soubesse quem é e o que deseja, quando a canção toca e os devaneios começam a cobrir a pele. 

Por isso, quando avistou o seu olhar, ligeiramente, naquela noite, já sabia que não havia escapatória. Assim, depois, o coração descompassado começou a acelerar a cada encontro. Estes não eram em si especiais e somente delas, mas, ao menos, podia ouvir sua voz e contemplar a sua face. Entre desfiladeiros e sentenças pronunciadas, buscava compreender estes sentimentos confusos, que brotaram de um momento duvidoso.

Depois, mil cartas confirmaram a sua versão e queria acreditar com todas as suas forças que o Universo a estava guiando para uma jornada resplandecente. Contudo, ainda não sabe. Não há resposta alguma do outro lado e passou a acreditar que jamais terá. Não enquanto os pés não pisarem no mesmo chão. Todavia, o que fazer quando precisa de qualquer sinal de reciprocidade para continuar a acreditar nesta história? Era para existir um sinal, não era?

Qual seria ele então? Os olhares para os outros? A ausência de qualquer vestígio de interesse? Como não desistir se não faz ideia do que está fazendo com a melodia que invadiu sua vida? A razão se esvai e jura para o vento que já não pode prosseguir com esta tolice. Porque é isto, não é? Uma fantasia estúpida que não entende. A sua pulsação acelera, a respiração falha, sente-se atordoada e tonta, mas por qual motivo?

Talvez, a outra ache graça e ria consigo mesma, pensando no absurdo de tal sentimento. Talvez, seja tão risível para ela, que nunca tenha parado para pensar sequer na tola menina apaixonada, que escreve confissões em sua página pública. Sim, como queria que fosse segredo se gritou para todos os cantos do mundo que havia se encantado pela borboleta radiante? É tudo tão confuso e até bobo que prefere parar a escrita até que tenha uma saída mais nítida para este labirinto que ela mesma criou.

Afinal, poderia ter ignorado estas emoções e seguido para outro rumo. Mas, não. Tinha que tentar, se expor e travar uma batalha com o invisível. Agora, não sabe como prosseguir e permanece em um estado quase de transe. Enquanto o cotidiano continua, enquanto elabora projetos, resolve problemas, abre os olhos de manhã e se protege com uma pilha de trabalhos. Mas, o anoitecer chegará e com ele todas as mesmas sensações.

No entanto, são apenas mais três noites, não é mesmo? Antes que possa fugir e se distrair. Até o dia em que estarão respirando o mesmo ar. Lá, neste futuro não tão distante, irá vislumbrar a melhor opção de caminho. Ou, assim espera. Porque é isto que tem feito por meses, certo? Esperar, esperar, esperar...

sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Na mesma terra


Mergulhar no seu beijo e saber que a existência completa faz todo sentido, era apenas isto que queria. Em sonhos, já vislumbrou todos os cenários possíveis. Nas madrugadas, os olhos insistem em ficar abertos. Quando avista o seu sorriso, seu corpo afunda na cadeira e quase perde os sentidos. Mas, é difícil de compreender de onde brotam todas estas sensações tão intensas. Parecem sem sentido, todas estas emoções correndo pelo sangue, se espalhando pela alma.

No entanto, precisa lidar com o fato de que talvez seja tudo ilusão, mas uma ilusão tão doce, que a mente navega dentro da promessa do encontro. Quando será e como será, ela deixa para o Universo responder. Somente o tempo dirá quais os passos certeiros desta danação tão nova e descabida. Talvez, tudo soe como mais uma de suas histórias insanas. Talvez, esta seja mais uma de suas narrativas flamejantes, que se desfazem como pó, quando a realidade bate na sua porta.

Todavia, como viver pela metade? Nunca soube. Se sente o horizonte resplandecer quando escuta sua risada, por que fugir? É preciso encará-la de frente para descobrir o que o destino reserva, quais os tons são melódicos, se há, afinal, alguma correspondência. E, se não houver, também já deixou o coração avisado. Não será a primeira vez que escutará o não, depois do sim. Nem a última. Mas, dentro destas palavras confusas, como achar as sentenças corretas para explanar uma jornada ausente de coerência?

Poderia descrever as razões para tal encantamento. Poderia soletrar cada verso escrito em seus cadernos secretos, que possuem uma lista infinita de poesias baratas, que havia perdido o costume de realizar. Poderia, além de tudo isso, rogar para que todes compreendessem que não existe lógica por aqui. Não há uma gota de racionalidade quando o assunto é a revoada das borboletas. Não tem confissão alguma que consiga abarcar a explicação para tal acontecimento.

Se conseguisse simplificar, reduzir toda a complexidade desta nova canção, diria somente que a pulsação acelera, os batimentos parecem que vão explodir, a tontura se instala e o resto é puro delírio. E do outro lado? Silêncio. Som algum emitido. Os motivos são desconhecidos, mas, no fundo, sabe as razões. Não adianta investigar nas cartas aquilo que se tem quase como uma certeza. Existe um castelo dourado, inalcançável. Nele habitam diversos muros extensos e intransponíveis. Jamais conseguirá passar por estas barreiras.

Ainda assim, irá tentar. Ainda assim, deixará que a tolice a domine. Ainda assim, não abandonará a caminhada. É necessário respirar o mesmo ar, escutar os mesmos sons, para que, em seguida, saiba o rumo certeiro para o qual se encaminhará. Enquanto os pés não pisam na mesma terra, segue pacientemente. Segue em busca de um sinal, de qualquer pista, para que possua a convicção de que não está sozinha. 

sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Eludir

Ela é fogo que se alastra nas madrugadas silenciosas e gélidas. Ela é flâmula que ascende em cada amanhecer e entardecer. Em todos os instantes, seu sorriso gruda na memória, seus olhares permanecem fixos no pensamento e nada é mais importante a não ser a sua voz imponente. 

É difícil saber como encerrar uma história inexistente. Mais ainda, é saber que a noite chega e seu corpo reage ao encontro, sem que possa controlar as suas sensações. Por isso, ainda que sonhando em fugir para o outro lado do mundo, para que não tenha que encarar a verdade, reflete sobre este desejo que é tão dominante.

Quando foi que tudo começou mesmo? Talvez, tenha sido no instante exato no qual a viu. Consegue recordar com detalhes os sentimentos emergentes e desproporcionais ao avistar a sua figura resplandecente. Inclusive, recorda, de forma vívida, a aparição de um pensamento certeiro em sua mente, naquele momento específico.

Sim, o de fugir, o de não prestar atenção. Assim, seguiu, com o foco quase inabalável, procurando construir a trajetória sonhada. No entanto, ao mesmo tempo, em cada minuto que passava, seu coração palpitava sem controle. Algumas vezes, falhava, até, em guardar para si como aquela figura lhe arrebatava.

Eram elementos apaixonantes tão incontáveis que foi quase desistindo de lutar contra o impossível. Mas, seguiu firme na batalha de tentar disfarçar e esquecer esta insana emoção, que não contava com justificativa alguma a não ser uma imagem encantadora. Talvez, isto seja o suficiente para alguns e, para outros, seja motivo de espanto. 

Já não faz ideia do que é apropriado ou não. Também cansou de criar guerras inteiras consigo para evitar sentir o incontrolável. Ao mesmo tempo, tem certeza de que este só pode ser mais um de seus devaneios insensatos e que falta pouco para ele sumir de vez. Falta um tantinho para terminar a caminhada e seguir em busca de outros horizontes. 

Todavia, seguirá melancólica, é bem verdade. Em suas descobertas mais recentes, sentiu um punhal cravado no peito e não faz ideia de como retirá-lo. Como esquecer? Como compreender toda esta equação borrada? Nem em seus sonhos mais infantis e tolos, imaginou que pudesse ser correspondida.

Então, por que driblar ou tripudiar? Por que revelar este segredo? Por que não guardar trancafiado na torre mais alta de seu castelo de ouro, em seu reino celestial, com seu rei e suas alegrias? O que resta agora a não ser dúvidas e questionamentos? O que sobrará ainda deste estilhaçado coração, no final das contas? 

É assim que percebe que as perguntas não são para a outra e sim para si mesma. Ela nunca fez parte desta história, desta fantasia estúpida. Não concretamente. E se existe neste céu infernal alguma resposta, minimamente, pronta, que encontre o mais rápido possível. Há de haver paz nesta revoada de borboletas invisíveis. Há de haver. E repete baixinho esta sentença, até que acredite de uma vez.


segunda-feira, 8 de novembro de 2021

Quando o silêncio acabar

 



A sonoridade de seu nome ecoa em seus ouvidos. A luz de seu sorriso ilumina o horizonte resgatado. No entanto, quantos dias irão passar até que possa revelar o segredo que já é tão óbvio? Poderá arriscar desaguar em seu céu, sem que ouça escárnio em formato de sentença ou duras palavras adormecidas? 

O pulo está preparado, mas não o coração em retalhos. Se ao menos chegasse o sinal prometido, saberia que os devaneios não são tão devaneios assim. Contudo, as madrugadas cessam e as certezas se desfazem. No outrora, era mais fácil de acreditar. Sem se mover e apenas observando, conseguia fingir que não ouvia sua voz porque não havia tentado.

Agora, após tantos meses correndo em sua direção, sem êxito, não faz ideia de como prosseguir. A coragem persiste, porém se sente tola e burra dentro destes rompantes de atitude. Deseja despejar todos os sentimentos guardados em quase um ano de enamoramento. Quer olhar em seus olhos e revelar toda a profundeza e insanidade destas emoções transbordantes. 

Mas, e depois? Em seus abismos criados, sempre o mesmo fim é alcançado. Sempre o mesmo som. Sempre a mesma mágoa. Seu intuito não é fugir, mas encarar. Todavia, as consequências serão colhidas e não terá escapatória. Mesmo assim, ainda que haja um não ecoando em seus ouvidos, terá convicção de que ao menos tentou. Ainda que precise encarar o que virá após a revelação, não deixará de falar. 

Nesta contradição, entre ser completamente quem é e dosar as margens da impulsividade, luta para aguardar a finalização da jornada, para que possa se libertar, finalmente, do silêncio condicionado. 

domingo, 3 de outubro de 2021

Fim sem começo



Em seus sonhos, o horizonte se enche de cores e vislumbra o seu sorriso. De olhos abertos, na realidade do cotidiano, procura encontrar resistência para enxergar a insanidade de seus sentimentos. Esquecer esta história absurda é o melhor caminho para seguir. Contudo, não é possível controlar as emoções e as sente em toda a sua intensidade. Não deseja mais estar neste estado, no qual vazio e plenitude se combinam em uma explosão fatal que abala e aperta o coração.

Olhando para trás consegue recordar o momento da virada, o instante que a danação se fez e já não poderia regressar para o ponto inicial. Contudo, foi na solidão que este arrebatamento se construiu e é nele que precisa ser apagado. E é para ser feito sempre. Quando o sol se despedir, quando o dia amanhecer, quando mirar o seu sorriso e escutar a sua voz, precisa resistir. É necessário internalizar que isto é uma fábula insólita e um caos incendiado.

Talvez, a não correspondência seja, de fato, a solução mais apropriada para seu destino. Entre promessas e clamores performados no outrora, a não repetição de padrões foi uma meta a ser alcançada. Por isso, não deveria nem sequer ter começado a olhar para o seu objeto de desejo. Não. Fugir seria a solução certeira. Não ver, não sentir, não se deixar abalar. Todavia, foi impossível não notar a sua presença ou muito menos não se afogar em um fascínio genuíno, que aquecia a pele a cada semana.

Como uma pequena brincadeira, um gesto ou outro era percebido. Como em um sonho distante, jamais considerou que todos estes detalhes iriam se juntar e formar um enamoramento tão profundo. Era tão somente uma figura distante e admirável, que observava, de longe, em toda sua magnitude e elementos encantadores. Mas, a armadilha se formou e se viu tola, vivenciando devaneios insistentes e que se alongam em passar. Porque é isso, tão somente, um devaneio ilógico, um desatino.

Como prosseguir ilesa agora? Provavelmente, é impossível sair sem abalo algum, mas tem que continuar na caminhada rumo a alvorada sonhada e com poucos resquícios de dor. É inevitável que seja árdua a trajetória, porém, ao final, estará liberta desta fantasia desmedida, destas lamúrias insensatas. Por isso, respira e relembra que há mais uma semana para se iniciar e sempre é tempo de recomeçar. O reinício vem para que consiga vivenciar a sua presença sem que seja torturante, para que suspiros bobos não tomem conta de si.

Que venha, assim, o princípio do fim, de algo que jamais aconteceu.

sexta-feira, 24 de setembro de 2021

Quando a fada se afogou em fantasias



Não enxerga sentido para este sentimento tolo não correspondido. Não compreende como seus batimentos podem acelerar ou a respiração falhar diante de uma situação profundamente absurda. Quando seus olhos passaram a emitir significados tão apaixonantes? Quando o ritmo da sua voz começou a comandar as batidas do seu coração? Todas as respostas para estas perguntas são inúteis, porque a sua escrita está condenada a ser estúpida, assim como os seus sentimentos.

A única questão que possui sentença certeira é aquela que versa sobre a impossibilidade do encontro, sobre a fantasia tripudiada pelos companheiros de jornada, pela tontura que a arrebata quando é hora de dizer adeus e somente ela sabe o quão é torturante o distanciamento. Porque chegam em sua mente as suas expressões, seus gestos, suas gírias, seu sorriso e suspira, boba em demasia. Se todas as canções tocam porque assim deseja, agora é hora de ver a aura incendiar de desejo sem que ao menos queira.

Quando escapou de seu horizonte a decisão sobre suas emoções? O passo estava firme para finalizar a missão tortuosa e seguir rumo ao destino tão desejado. Agora, nem lembra mais por qual motivo começou a trilhar aquele caminho e tudo soa como ilusão. As decisões estavam postas, jamais deixaria que a música incessante dos pássaros a distraísse de seus propósitos. No entanto, se vê perdida em pensamentos inúteis sobre as tonalidades das roupas que traja ou como sua voz preenche o espaço e tudo já é feliz e coberto de cores cintilantes, apenas por estas razões.

Atropelada por estes devaneios recorrentes, segura-se firme na recordação dos seus desejos primevos, na lembrança do real objetivo para estar ocupando aquele lugar, vivendo aquela experiência. Foi para fomentar conhecimento, não foi? Foi para apontar para o topo da alvorada e seguir, desacompanhada, rumo ao destino sonhado. Então, por qual razão sua mente insiste em trafegar por imagens de sua fisionomia reluzente e cheia de energia flamejante? ´

Sim, talvez saiba a razão. É porque ela é candência pura e cristalina. Ela é o sol que irradia toda a potencialidade do Universo. Em sua aparente acidez, há uma insistente revoada de espontaneidade e de sutilezas, que encanta e derruba de enamoramento os desavisados. Ela é véspera de céu incendiado, é uma explosão progressiva de emoções plurais, que quase hipnotiza. Está tudo ali, basta observar, atentamente, ainda que na distância cruel.

E são por estas razões que agora tenta respirar suavemente, sem que o sangue corra velozmente e confunda os seus propósitos. Ao final da escrita, há pouca coesão, é bem verdade, mas resta uma compreensão de como precisa prosseguir. É uma saída triste, porém a única existente. É necessário eliminar tais percepções, tal flagelo que é estar conquistada por uma paixão impossível. 

Que a fuga seja concretizada, enfim.

quarta-feira, 15 de setembro de 2021

Wie ein Schmetterling



Quantos dias enclausurados terá de viver, antes de ver seu sorriso brilhar diante dos seus olhos? Quantos disparos o coração irá promover, até que seja verdade a história imaginada? Os meses escorrem e a sentença parece certeira: é ilusão, os sinos não tocam, é pura fantasia em véspera de desencontro. Em cada despertar, reconhece que possui somente perguntas. A distância é tão palpável que quase desiste de tentar, pelo menos, procurar algum horizonte possível.

Contudo, o fato é que escutou a canção ressoar e, mesmo com dúvidas, não quis negar a percepção de um momento tão rico de emoções. Foi um lampejo de sonho ou uma esperança no ar. Agora, o equilíbrio da ventania bate nas portas incendiadas. Seria ela a paixão desmedida nas cartas anunciada? Seria o início de um júbilo proclamado, finalmente? 

Depois de tantas tormentas, é sufocante acreditar que encontrou o fim da torre inalcançável, o descarte da tormenta angustiante, que era essa espera por uma figura incerta. No entanto, a busca implacável pode ter sido em vão, já que o silêncio se faz permanente. Neste desprezar recorrente, respira fundo e tenta encontrar uma saída realista para superar o que não é, porém poderia ter sido. 

Não há mais o que desaguar nesta escrita vacilante, somente, ao certo, frases repetidas e confusas. Elas rimam com estas emoções oscilantes, previstas naquela tarde iluminada. Por isso, tenta buscar uma esperança diáfana de que os olhos se encontrem, que diga sim, que revele qualquer tipo de correspondência. Precisa se banhar nas águas salgadas, para que a serenidade de não ouvir uma resposta significativa se estabeleça, pois este tormento tolo já está tão irremediável quanto a sua insistência em enxergar um brilho que pode nem haver.

No sortilégio das horas, deita-se apavorada. Aguarda, quase como uma sentinela. Envolvida nos clichês, nas memórias de ocorrências pontuais, controla-se para que a ansiedade não domine. No sopro eterno das giradas do Universo, somente ela pode resolver este enigma, que não tem ideia de como manejar. Só precisa, tão somente, que neste lampejo de chances esvaziadas, não perca a revoada da sorte. 

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Farelos e pássaros




 

A ilusão da presença. A certeza da perda inabalável, vinda do passado cinzento. A insistência em dominar situações impossíveis, a teimosia em pisar com os mesmos pés, no mesmo chão. Os olhares e os corpos continuam não se encontrando. A mesma pergunta soa em sua mente tão confusa: por que o futuro não é exatamente como deseja? Ou é o presente? Ou não fora o passado? 

Gostaria de performar um solilóquio infinito, no qual pudesse contar cada gota despudorada de derrota vivida em sua jornada cambaleante. Ainda assim, seria incapaz de elencar todas as misérias de seu tolo coração. As portas se fecharam demais, a voz se calou também, a tempestade cessou e a indiferença deixou sua resposta em formato de lama. 

Coberta até a boca, quase já não respira. No entanto, cata com a língua as pequenas migalhas que voam ao redor. Talvez, antes que sua trajetória se encerre, consiga aproveitar os últimos minutos de farelos jogados e alcançados. Falta apenas um tantinho para que esteja completamente coberta, porém tem certeza que vale mais não se mexer, ficar paralisada, observando o céu de seu sorriso e as pequenas piscadelas vacilantes, de quando em quando. 

Sobre o soterramento, nada faz ou fará.  A firmeza de sua decisão, de sua tola escolha, é feita, pois não cabe espaço aqui para dúvidas. Caso o fizesse, caso se salvasse de sua ruína, a perda das pequenas faíscas seria uma possibilidade. Por isso, segue, dedo por dedo, mergulhando mais fundo e contemplando a luminosidade daquela existência, até o seu último suspiro...

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

A guardiã e sua música


 

O seu sorriso é como brasa que incendeia o coração. A sua voz é como uma canção melódica, que embala os ouvidos em tom de festa. A separação é injusta e lamentável, porém não há escapatória. Os caminhos são tortuosos demais para que possam se encontrar. Neste desmazelo infiel, revive na memória os instantes de júbilo. 

Neste desprezar recorrente, com sabor de fel, deixa que a fantasia se espalhe e a ilusão devore os sentidos. Não adianta acreditar que será diferente a resolução de uma fórmula com números semelhantes. O que resta são os sussurros e olhares da madrugada. A infinita contemplação, que parecia sem fim e acalentava a aura apaixonada. 

Ainda parece um sonho - e mesmo que esta sentença seja melosa, é necessária, porque esta é a sensação exata. Não há um dia que abra os olhos e seu nome deixe de vir na mente, que o pulso não dispare ao recordar seu nome. Guardiã da música, mas também de seus desejos. Fadada a não enxergar adequadamente, cumpre sua ingrata missão, deita em flores de pedra e profere frases malditas. 

Na queda, o último som escutado é o de sua risada. Isto a protege da dor do impacto de perceber que fora sua e já não é mais. Em sua sabedoria, performa a melhor trajetória, seleciona a decisão mais apropriada. Contudo, a vontade é que fosse diferente e a viesse resgatar da derrocada. Se pudesse voltar ao passado e se encaminhar para outros rumos, seria grata e jamais subiria para a torre outra vez. 

No entanto, a simplicidade desta prece não consegue quebrar com a dura realidade vivenciada. São outros tempos, são outras estratégias, outros corpos e mentes. Não há como negar. O controle da narrativa não é apenas seu, tão pouco da outra, que insiste em cavalgar em sua direção. Ainda que rogue, apenas escutará escárnios e palavras ressentidas. 

É preciso seguir. É a única opção plausível, palpável e definida. Enquanto isso, roga aos céus que a esqueça de uma vez. Pede em cada sopro de vento, que a leve para estradas distintas, que seus olhos não se encontrem, que sua voz não seja mais escutada de tão perto, que vivam em plenitude, ainda que distanciadas. Implora, sedenta que, na verdade, seja tudo o contrário, porque é de vício que está falando e não de auroras reluzentes. 

domingo, 4 de julho de 2021

Trégua


 

Prende-se na fantasia de que um dia as flores irão se abrir e o sol poderá, finalmente, iluminar a sua alma. Em tardes sombrias, proclama aos céus como são injustas as decisões do destino. Enquanto as lágrimas brotam de seus olhos, permanece atenta aos sorrisos que chegam em seu seu caminho. Não quer estar mais desavisada quando os sinos tocarem. Já é insuportável o peso de estar apaixonada. Após tantos anos correndo em direção do amor, agora, prefere entoar canções de distanciamento, de reclusão e de palavras amargas.

Quanto mais respira, mais afasta todas as chances de encontrar outra vez uma cantiga melódica. Isto porque não vê razão alguma para pular em outro precipício sem fim. É demasiadamente cansativo viver embalada em repetições recorrentes, em um oceano que afaga, porém que também afoga. Mas, o afogamento acontece diante das ações e sentenças que ela mesmo executa. Se ao menos conseguisse corresponder aos clamores do mundo banal. Se ao menos conseguisse se comportar e sentir corretamente, poderia, enfim, dizer que está pronta.

Mas, o que seria isto enfim? É alarmante a capacidade dos outros em colher frutos de jardins cinzentos. Ela não. Por onde passa, deixa os pastos mais verdes enlameados e pútridos. Seu coração é intenso demais, deseja demais e sonha demais. Quer sempre mais. E nesses goles sedentos, cai na tortura da embriaguez e do egoísmo, esquecendo da outra face. Não vislumbra o correto, porém tão somente a vontade que banha a sua alma e já quer, para ontem, o impossível. É neste desencontro que perde cada sonata resplandecente. É neste desmazelo que se assemelha ao fantasma que vive grudado em seus pensamentos. 

É nesta tardia reflexão que se agarra, para que possa entender por onde andou em todos estes anos que já foram e não voltam mais. Tudo está tão desconexo que o tempo caminha, os pássaros cantam, mas  a madrugada não chega, tão pouco o seu encontro com a perigosa sereia encantada. Ela que, com sua voz doce e rosto angelical, domina suas emoções e a faz esquecer de toda tensão existente, em qualquer lugar do mundo. Contudo, não era sobre isso que sua escrita gostaria de falar. Não há paixão incendiada que possa salvar sua jornada apodrecida. Talvez, a solução seja a solidão irremediável. Em sua morada, cria um ambiente paralelo, onde todos os espasmos de dor são disfarçados com afazeres inesgotáveis. 

A cada amor, mais uma dose de trabalhos sem data para acabar. Em cada decepção, outro compromisso que se enfia em seu cotidiano. Ao certo, em uma noite qualquer, descobrirá a resposta para seu enigma apavorante. Ou, em suas escolhas incertas, assumirá de uma vez por toda que jamais irá se encantar pela paixão outra vez. Afinal, quer se enganar como nunca antes e afirmar para todos os cantos do planeta que a sua capacidade de sentir foi possuída por um cansaço físico e mental e já não há como voltar atrás. Precisa seguir o rumo da concentração máxima em suas atividades e não pode enxergar o novo vindo. 

Agora, no hoje, inabitado de presenças candentes, bebe da convicção de que alcançará a sua meta tola e, finalmente, tocará na liberdade. Que seja assim, então, no hoje despudorado. 

sexta-feira, 4 de junho de 2021

Por todas as flores que roguei que não fossem para você

 


Todos os dias anoitecem e seu nome é sussurrado como um tormento. Todas as cores são pintadas nesta parede de fantasia e a lembrança de seu beijo se confirma. 

Não há como permanecer quando todos os pactos foram selados e o pertencimento parece mais importante. Não existe rastro, sombras ou pó que possam resgatar o impossível. 

Jamais imaginou que teria pulado sabendo já, tão anteriormente, que as rimas eram impossíveis de serem formadas. Jamais, em sã consciência, teria abandonado tudo que desejou para dizer sim e olhar na sua face novamente. 

Os dias se alastravam e já sabia que, quando avistasse a jovem desprotegida, tentaria colocar ela em um vinil de prata. O seu desejo de cuidar seria tão forte quanto o de possuir. Assim, já não sabia como finalizar uma canção tão sutil que apagava o horizonte da sorte. 

Agora, tão somente, deseja respirar e já saber. Caminhar e não mais titubear. Olhar para a morte, que é a quebra dos pactos insensatos, e se desvencilhar de vez de todos os infortúnios. 

Ela sabe que o pulo é maior que isso. É mais intenso do que qualquer sabiá, é mais profundo do que o espelho, é mais honesto do que a dama prometida. É mais, que tudo, que todos, é caos despudorado na hora da sorte. É sacrilégio bem perto da injúria que é este corte. 

Quando disse sim, foi para que se banhasse de esperança e novos caminhos. Quando estes rumos se fizeram tortuosos, já não soube mais como finalizar esta sonata repetente. Pois são cruéis os dias, por isso se prende à noite. Foi nela que se deitou e rogou pela escolha certa. 

Foi tudo premeditado, não foi? Pois, então, que se cale. Que possa jogar no infinito todo sorriso maléfico que não seja pra ficar. Que queime a certeza de pertencer sem jamais habitar. Que seja primavera em pleno inverno. Que habite cada quarto de flamas incompreensíveis. 

Um dia, ela chegará. Em seu vestido candente, irá sussurrar que tudo era tolice e a véspera de pranto cessou. Esta falará que agora sim, que todos os dias serão de luz derradeira e no final de cada sentença besteiras proclamadas para o vento irão de alastrar. Assim como um dia jurou em fazer. 

Porque é de fim que sabe cantar e não dos começos. 

domingo, 30 de maio de 2021

Passarinho

 Era primavera. Ébria e confusa, custava a entender quais eram os próximos passos para sua jornada. Então, decidiu partir para a aventura mais insana que já viveu. Entre abraços e sorrisos, acabou por se encontrar ao lado de uma paixão inesperada. 

Demorou para perceber o que estava para acontecer, até que seus olhares se encontraram e a festa se fez em seu coração. Depois, não conseguiu mais escapar daquele sentimento. 

Como se desfazer de uma sensação tão forte e rubra? Como recontar os dias, agora, em seu castelo de solidão? 

É bem verdade que tentou trancafiar essa história no baú mais profundo e enterrá-lo para todo sempre. No entanto, o guardou dentro do coração e ele insiste em emergir, quando os sinos tocam e a noite não cessa. 




Cada instante daquela madrugada de celebração persegue seus dias e as fantasias sobre o que poderia ter sido continuam a ressoar na mente e na pele. 

Se não há mais retorno ou solução, por que seguir com os pensamentos nesta canção abandonada? Se não existem mais chances, por que não esquece de uma vez qualquer recordação do seu beijo? 

Não existe resposta aqui, somente a espera e o tempo. Somente o aguardo das novidades do destino. Ou, tão somente, a resignação e a compreensão de que as respostas já existem e ela apenas precisa respirar fundo e soltar de vez qualquer migalha de esperança de um horizonte resplandescente. Contudo, há muito por vir. 

Ainda que a noite fria e cheia de embriaguez reste somente na memória, ela existiu. Aquele momento será sempre eterno e o manterá cravado na alma até o derradeiro suspiro. Por fim, pode voltar para a sua negação costumeira, fingindo que o sol já se pôs e agora é a hora da alvorada cintilante. 


quinta-feira, 13 de maio de 2021

Solar do júbilo

 



O sol não habita nela. Não, ela é o próprio sol, que ilumina o seu coração, que quer gritar a todo instante que a paixão se faz presente. Agora, embebida de outro tipo de sentimento - um menos ganancioso, é bem verdade -, deixa florescer todas as emoções necessárias para se construir um sorriso.

Quando foi a última vez que sentiu um pertencimento tão absoluto em uma melodia tão harmoniosa, porém sem caos? Talvez, nunca houve tal momento em que o encontro se enlaçou com o destino e se fez presente na hora certeira. Talvez, seus pensamentos estejam afetados pelo sentimento progressivo que se encaminha em direção do infinito. 

O que sabe, no presente momento, é que as pupilas dilatam e o pulso acelera, numa mínima lembrança de sua presença. Depois, respira fundo e tenta recordar do seu beijo. Este que mescla ternura e voracidade. Este que encanta e afaga. Este que se faz múltiplo e liberta a aura em formato de prosa. 

Cada canção ressoa de uma maneira. Esta, a de hoje, tão florida, parece várias em uma só. Por isso que vibra tão profundamente. Seus passos cruzaram com os seus e todo o resto se desfez em água cristalina. Esta que banha o corpo em véspera de desespero.

É porque a sua existência já faz a sua mais encantadora. É porque seus lábios são doces e inebriantes. É porque suas mãos tocam as suas e reconhece toda a complexidade de dividir o ar com ela. Ao seu lado, todas as fadas dançam e permitem a sua entrada. Todos os sinos ressoam. Todas as criaturas celestiais abrem os portões de sua morada e proclamam a permanência do júbilo eterno. Ao menos, enquanto está ali, na partilha dos minutos corridos. 

Mas, não deseja terminar esta escrita singela. Poderia escrever para todo sempre. Poderia cantar e contar para cada parte do Universo que a ama e todos os significados que esta sentença possui. Contudo, por hoje, suspira e se alegra em saber que o amanhã virá e o Tempo será justo, selando o reencontro tão esperado.

sábado, 8 de maio de 2021

Ela, que é feita de vendaval




O vento soprou em seus ouvidos mais uma vez. De mãos dadas com o infinito, obteve as respostas para as suas perguntas. Depois, se derreteu em lágrimas, mescladas com sorrisos. O pânico abala, mas também recarrega as energias. Em seguida, recorda do seu sorriso e a existência se justifica. 

Quando é a primeira vez que se descobre a paixão por alguém? Quando a madrugada e o tempo não são o suficiente para despejar todo o afeto que mora dentro do peito? As horas são finitas e a sua partida soa injustificável. Mas, pela necessidade da ida é que tão mais saborosa a presença. Entre dilúvios, melôs e pedidos, a realidade é a mais cristalina e doce de todas. 

Se o pedido da permanência foi concretizado, foi para que pudesse pertencer um pouco e caminhar, lado a lado, de qualquer maneira que fosse entregue. E quando vislumbra seus olhares tão profundos e verdadeiros, tudo se esvai e é somente júbilo e coração acelerado. Quando os seus braços se abrem, todos os oceanos jorram nos pés e os rios cantam em festa. E é por nós, para nós, que os pássaros entoam canções e o vento diz que sim. 

A ventania que habita sua pele roga pelo reencontro e confere a permissão necessária. Ainda, há o toque da brisa. Este que também disse sim, numa manhã um tanto sombria. Cada frase proclamada é apenas de confirmação. “Vá. Seja feliz. Não olhe para trás. É no hoje que se faz festejo e poesia”.

E foi. E fez. Somente.

segunda-feira, 26 de abril de 2021

Quando o vento soprou a verdade em seus ouvidos

 Fuga, suspiros e, depois, o alívio. O poder da sua existência banha o coração petrificado e, em seguida, enxerga apenas uma luz reluzente e rubra, que percorre toda a alma. Aquele encontro anunciado foi véspera de júbilo desmedido e tudo que veio depois apenas existiu para confirmar a sua intuição. Então, era para ter se entregue velozmente, mas o temor foi mais forte. Talvez, as construções cuidadosas sejam mais profundas ou tudo que importa é o gosto do seu beijo. E é por isso que escreve com tanta transparência e doçura, porque foi arrebatada por este sentimento tão intenso, que a faz proferir sentenças clichês. Esta é a doce sina dos apaixonados.

Assim, roga para o destino que seja cauteloso com os próximos passos a serem seguidos. Implora para o Universo que o pulo seja leve e o pouso tranquilo. Já não pode mais suportar escárnios e desilusões. Mas, nada disso importa no presente. O que importa é o seu sorriso suave, que embala seus sonhos, a recordação de seu jeito sensível, mesclado com toques de sarcasmo, a sua persistência em alcançar a felicidade plena e seguir o rumo que desejar. Há um misto de resiliência com paixão, que guia os passos dela. Assim, sente-se contagiada por toda energia candente que ela emana e já sabe a noção completa do que é alegria, sem fazer nenhum esforço. 

Entre entregas, conquistas e confissões, cada muro foi sendo quebrado com cada toque suave de gentileza e ternura que habitam em sua pele. O céu se ilumina e o mundo inteiro parece cantar em uníssono quando a sua presença é anunciada. É justamente esta sensação que tem ao encontrar o seu olhar profundo, as suas ações complexas, as suas palavras sinceras, é como se tudo fosse festa e o futuro fosse promissor. Não adianta negar o impossível: deseja sentir, com toda a dedicação existente no Universo, completamente, cada momento ao seu lado. Não quer perder nenhum segundo de contentamento, jamais quer que sentimentos negativos tomem conta dos seus caminhos e destruam qualquer laço criado.

 


 

Contudo, tenta vislumbrar onde está guardado o último gole de sensatez. Talvez, o tenha jogado fora, naquela manhã melancólica e dolorosa. Depois daqueles tortuosos instantes de desespero, decidiu não mais segurar seus desejos e deixou que as vontades determinassem cada escolha. De certa maneira, optou pelo incerto e queimou as dúvidas. Em seguida, proferiu baixinho que já era sua e não havia mais retorno ou salvação. Era e não saberia como esconder mais as emoções transbordantes e que já estavam sufocadas pelas tolas negações afirmadas. Na sua fuga, pensou com nitidez que queria uma libertação de algo que não sabia responder ao certo o que era. No entanto, era deste arrebatamento, desta sede que nunca cessa, que tentou escapar.

É sempre impactante constatar este tipo de verdade, porém o vento soprou na direção certa e conseguiu avistar a melhor resposta para cada danação. Na verdade, deixou que os pássaros cantassem outra vez, deixou que os sinos ressoassem no peito e prometeu, agora gritando, que já não importavam as lamentações, as promessas do passado, o receio das juras derramadas. Não, o que realmente é possível é fechar os olhos, saltar em direção do reencontro e deixar que o resto apareça devagar. O sim apenas começou e resta, no exato momento, saber que o presente é saboroso. Então, que a canção toque no último volume e dance até não aguentar mais. Até o infinito. Sem sombras, sem rancores, sem pedidos demasiados, somente suspirando.

sexta-feira, 23 de abril de 2021

O deleite do encontro anunciado no outrora

 Era para ser desde o princípio. Naquela noite, sua voz invadiu seus pensamentos e seu coração. Entre um trago e outro, o olhar e o sorriso cativavam e houve uma espécie de certeza interna. Ao se encaminhar para ir embora, ainda olhou para trás, com o desejo de permanecer. Depois, veio todo o vendaval que continua tentando superar a cada dia. Existiu também o afastamento compulsório e a pausa para o que viria em seguida. Quando os gritos da madrugada cessaram e a liberdade, finalmente, chegou, decidiu como quis os próximos passos.

É difícil encontrar metáforas para o óbvio e sentenças diretas para o inexplicável. Quando, enfim, o reencontro aconteceu, de fato, as sensações eram tão mistas e as emoções estavam tão afloradas, que houve uma explosão de sentimentos. E tentou se segurar onde podia: nos afazeres cotidianos, no sarcasmo protetor, na fuga sem dimensão. A cada banho de realidade, mais certezas, menos abandono e mais coragem de olhar de frente e dizer sim para qualquer pergunta ou chance.






E foi porque disse sim, porque se despiu do medo e das dúvidas que enxergou seus olhos com mais nitidez. Outra vez, sua voz invadiu seu coração. Este órgão estilhaçado e um tanto amargurado, é bem verdade, pulsou cintilante, relembrando como é bater sem temor. Assim, soltou todas as cordas, os atravessamentos, as incertezas e correu para sua direção. Então, queria respirar cada respiro seu, sentir todos os seus toques e nunca mais soltar. Entre um suspiro e outro, havia o entardecer cósmico, o entendimento profundo, o dia que virou noite e foi dia outra vez.

E agora? Entre as milhares de possibilidades do destino, não seleciona nenhuma. Deixa que o sol bata na face e recorda de cada sensação. É sempre forte quando um beijo desequilibra os sentidos e reascende algo tão guardado. Quando é inesperado, é ainda mais doce. E doçura é o seu novo adjetivo preferido, porque a faz lembrar da canção mais melódica, suave e intensa que já escutou. Então, que ressoe em cada milímetro de sua pele e não cesse. Até que não possa mais, até o para sempre ou o nunca mais, até que os pássaros encontrem o caminho de volta. O até não importa. O hoje sim. 

segunda-feira, 5 de abril de 2021

Quando a fada escutou o vento

Lembro do seu olhar profundo e como seu rosto se tornou fixo em minha memória. Recordo de cada expressão quando nosso encontro aconteceu pela primeira vez. A surpresa fora tanta que as armaduras ruíram e fiquei perdida, neste encantamento revelador. Dali em diante, mirar o céu era como se estivesse ao seu lado. A sua voz embalava meus sonhos e as promessas eram profícuas. 

Não sei ao certo quando seu sorriso se desfez e nossos caminhos não mais se encontraram. Naquelas noites de outubro, deixamos que as dúvidas contaminassem nossos passos e a distância fosse cada vez mais intensa. Após o rompimento dos laços, cada lembrança era como fogo que ardia a pele. A cada minuto de abandono, o silêncio crescia e a certeza da despedida também. 

Contudo, fomos enganadas pelo destino, não foi? Quando tudo resetou e o Universo te trouxe de volta, as ações foram impossíveis. O mundo já era outro e seus braços não estavam mais presos aos meus. Mas, o retorno ocorreu. Ou tudo é confusão, confissão e poesia. Mas, já não importa. De alguma maneira, você permaneceu.

Hoje, os sinos tocaram novamente e foram por ti. Hoje, uma espécie de resgate foi possibilitado por um mago do destino, que se aproximou e soletrou as palavras que tanto desejei ouvir, lá, no outrora despedaçado. No entanto, não sei bem o que será de nós, do futuro ou do tempo. Tão pouco, se irei aguardar o final da resolução deste mistério. 




O que fica, aqui, é a absoluta convicção de que o antes foi acertado, que o seu sorriso foi sincero, que o som dos pássaros - naquele amanhecer insano - cantaram e eu já sabia que eu precisava daquele encontro. Ali, naquela cidade fria. Ali, sem querer partir jamais. Ali, onde pude enxergar um afeto tão sincero se construindo.

O resto é pó e toda uma estrada ainda para seguir.

domingo, 28 de março de 2021

Shhhh...


        Anime Turismo: Fãs de Suzumiya Haruhi salvam o relógio da Estação de  Nishinomiya! » Anime Xis         

     

Antes de conseguir prosseguir, é preciso expurgar todo o sentimento que transborda e aperta o peito. Entre promessas sem sentido e memórias silenciadas, tenta encontrar uma resposta mais alegre e menos melancólica para seus dias. Depois de insistir em tentar apagar de vez qualquer recordação de sua pele, lembra de sua voz e seu sorriso. Então, reconhece que falhou demasiadamente, para, depois, decidir encarar de frente, que já é dor e não mais festa e fantasia. Se um dia disse sim foi porque confiou nas boas novas trazidas pelo vento. Se pulou do abismo certeiro, foi por convicção de que estava acertando. Contudo, não é tão fácil assim, não é mesmo?

Em tempos de impossibilidades e desafetos, tudo cresceu. Seus passos eram consumidos pela dúvida, seu silêncio provocava mágoas e desespero. Cada vez mais a distância aumentava, junto com as lágrimas secas, presas na garganta. Os sonhos eram invadidos. As noites sem fim, condenavam a sua mente solitária. Caso fosse em uma situação distinta, abriria as portas, mergulharia na água salgada e as sensações se reduziriam. Mas, não foi assim. Não é assim que é. A sua realidade a esgota e todo o passado reluzente afagava a sua alma cansada. Sem paraíso, resta somente o amargor.

O seu desejo agora é abandonar esta escrita, recomeçar, procurar explicar melhor o que deseja dizer. Contudo, ao mesmo tempo, que ir até o fim, descobrir o que guarda o seu peito em chamas, a sua aura partida, o seu inconsciente que grita quando decide contar sobre seus devaneios. Talvez, jamais entregue todas as cartas rascunhadas na madrugada. Talvez, nunca mais conte para o mundo sobre suas emoções. Pelo menos, não para ela. As suas sentenças são pesadas demais. Não há como escutá-las mais uma vez sem desistir de continuar a trajetória. Caso termine este texto sem nexo, confirmará que apenas o vazio se mantém firme, junto com as ondas que molham a face. 

Não há mais salvação, repete para cada canção. Se o começo é diferente, o final já é reconhecido. Sempre é igual a hora de desistir. Só precisava de um sim, mas este jamais chegou. Por isso, roga pelo encontro da saída mais rápida e certeira. Implora para que a movimentação da espiritualidade seja um tantinho mais rápida. Aguarda a alvorada dos pássaros ou o novo ressoar dos sinos. Até para músicas desconhecidas se abriria, se estas tocassem no tom correto. Só não quer mais esta que insiste em continuar tocando. Não deseja mais pisar na mesma estrada. Roga por qualquer transformação no Universo, qualquer melodia descompromissada. Aguarda contando os segundos. Já passou da hora de compreender que o silêncio também é resposta, que nunca houve ilusão mais devastadora, que já foi e não pode ser mais.

sexta-feira, 26 de março de 2021

Sorriso que condena


 Foi em direção das respostas certeiras. Depois, avistou o seu sorriso. Aí, suas forças se reduziram. Agora, coloca em palavras todo sentimento que habita a sua pele e já havia sido reconhecido desde o princípio. Como verbalizar algo tão inaudível, que apenas as respirações são capazes de traduzir? Em sua existência, viu um mar de certezas e respostas. Em seu sorriso, fincou bandeira e já sabia. Nunca duvidou dos seus sentimentos. Quando vislumbrou a sua presença, já reconhecia. Lá, no encontro prematuro. Ali, já possuía todas as respostas deste fragmentado presente. Enxergou os seus olhos e temeu. Procurou fugir, mas foi inevitável.

A cada amanhecer, as respostas eram cobertas por um aperto no peito que não cessava. Entre dúvidas e questionamentos, colocava-se diante do precipício mais singelo de todos. Enquanto desvendava as soluções para os enigmas daqueles sentimentos inevitáveis, procurava ter a certeza de suas ações. Quando foi o último suspiro destinado a ti? Procurava derrubar fantasias e memórias impossíveis de destruir. Entre uma lembrança e outra, tentava se agarrar aos fatos. Contudo, em seu tolo coração sentia que somente uma pausa era realizada. Gostaria de acreditar - com todas as forças que ainda habitam sua alma - que a canção era sonata, que jamais seria uma marcha fúnebre.

Neste descompasso - um tanto zonza e incapaz de coletar as sentenças necessárias -, cobriu-se de espinhos e negou, com toda a convicção que ainda lhe restou, que acabou e já para sempre. Jurou para todos que sentimento algum iria cobrir a tua face. Prometeu para o vento que é possível negar até o infinito. Contudo, entre os seus, rasga o peito de saudade. Invade as realidades, quebra com as lógicas, nega e pragueja os próximos passos. É sua e é inteira. É caos e tempestade. É canção que não acaba mais. E já não importa os escárnios proferidos entre os seus. Não interessa se do outro lado existe tão apenas pérfidos comentários. Já queimou todas as eternas trocas de desgosto. Não é por isso que se guia. Ela se pauta por suas missivas incompletas, por seus ruídos de dor, por seu gargalhar sem sentido, por sua certeza de que todas as metáforas farão sentido, enquanto consome as letras pregadas nesta confição.

E ela jura que será diferente, que será outra. E ela implora por um pouco mais de tempo, por um pouco mais de perdão. Depois, suspira e roga para todos os cantos do Universo que o seu respiro tenha sido real. Não pode ser, não é mesmo? Mas, é tão somente uma palavra. O resto é passo firme incendiado, é pranto seco em véspera de confirmação, é beijo negado diante da danação. É enorme, não é mesmo? Então, que queime até a fagulha derradeira. 

sexta-feira, 5 de março de 2021

Missiva incompleta


 

A noite chega e com ela o seu silêncio perpétuo permanece. As chagas do outrora permanecem atrapalhando os seus passos em direção do sossego. Seu nome está cravado como um punhal em sua pele. Seus dias cinzentos chegam sem renovação. O desespero confunde os pensamentos e já não sabe mais quem é. A madrugada seria a resposta. Contudo, finge não enxergar o óbvio. Em sua perda, desequilibra a caminhada para que saiba como é possível retornar. No entanto, não existe jornada de regresso. A partida anunciada foi revelada insistentemente.

Agora, espera que o tempo deixe de consumir seu coração estilhaçado. Sussurra para o vento sobre a saudade e o amargor que restou no final da canção. A música cessa quando os abraços são interrompidos. A chegada jamais acontecerá. Foi por isso que o primeiro adeus fora proclamado. Não foi? Se os olhos não se encontram e os dias se repetem, como quebrar as barreiras da solidão disfarçada? É com toda a calma que habita em sua alma, que roga para que o afastamento seja estabelecido. Ainda assim, a outra tenta, inutilmente, desabar os muros construídos. Ainda que seja com as unhas cobertas de sangue, insiste em rasgar a muralha levantada.

Os espasmos de dor são recorrentes. Procura apagar da memória o sorriso que antes provocava alegria. No presente, o escárnio é quase palpável. Se soubesse como voltar para o início, o faria. Se pudesse jamais ter tentado tocar o júbilo, não teria se queimado e tudo seria mais leve. Mas, não foi isso que ocorreu. Desejou intensamente devorar cada segundo ao seu lado. As vontades dominaram os pensamentos e, outra vez, falhou em manter a dignidade. Por que algumas músicas são tão avassaladoras? Não sabe a solução deste enigma tortuoso.

O que tem certeza é que apenas o Universo escuta seus clamores. O resto é pranto seco guardado no peito despedaçado. Se um dia foi sua, foi por querer, profundamente, pertencer. Não há como cobrar uma outra realidade que não esta. Se incendiou completamente a estrada de volta é porque sabe o tamanho do pulo, bem como o vendaval que mora ali dentro. A fuga é certeira, mas a ausência é mortificante. Se ao menos a visse em algum momento, poderia ter a certeza que foi tudo fantasia. Deve ser, só pode ser. Não quer mais lamentar pelas decisões e sentimentos incontroláveis. Ou pela memória apagada. Ou, ainda, pelo caos convocado por seus atos. 

Quer ir embora. Implora pela liberdade. Quer selar o pacto consigo e não o quebrar jamais. Prefere correr para outros jardins, para um outro sorriso que não o dela. Mas, já está preenchida de confusão. A mente apaga quando a exaustão é alcançada. Assim, finaliza esta missiva quase secreta. Assim, entrega as palavras mal escritas para o mundo. Assim, fecha os olhos para que seja logo amanhã e sinta um pouco menos a sua falta.

quinta-feira, 4 de março de 2021

Quando a madrugada grita

 Quando a madrugada grita em seu silêncio. Quando os sinos não podem soar e a alvorada dos pássaros é interrompida. Quando o sorriso se apaga e resta somente desgosto. É ali, no derradeiro momento da perda do júbilo, que se deita em prantos eternos. Jamais poderia imaginar que escreveria cada palavra engasgada em seu diário de lamentações, com um aperto infinito, com desespero e sofreguidão. O seu destino estava colado junto ao seu. A noite era coberta por promessas impossíveis, por um resgate que jamais viria.

Não é bem isso, é? Em sua torre, nunca virá a salvação que tanta almeja. Pois não há resposta alguma em mares que desaguam nos pés, para depois secarem. É dentro de si que moram as soluções, as preces sussurradas, a certeza de que pertenceu. Em abismos inescapáveis, procura uma sentença menos dolorosa. Tenta retirar a lama que finca os pés no chão e a torna imóvel. Se ao menos soubesse cada frase proferida no passado, talvez, a paz fosse instalada.




Contudo, gira em círculos, seja em suas frases ou em sua caminhada. Novamente, está sem saída, sem retorno. Ao recordar do início, se dá conta de que o fim não seria outro. Não haveria como transformar as ações recorrentes do outrora. Pulou demais. Exigiu demasiadamente. Ultrapassou todas as barreiras que foram negadas, apenas para escutar mais um não a cada amanhecer. Seus olhos querem fechar, mas eles não cessam. Estão abertos, em movimento, e não deseja mais pensar no impossível.

Através de cada janela, vislumbra o mesmo céu, o mesmo sol. No entanto, as distâncias não diminuem. Não há escolha alguma que não a tão sonhada fuga desta sensação, deste sentimento inesgotável, da intensidade errônea que insiste em perseguir. Se o horizonte não resplandece como o esperado, tudo se incendeia e é somente caos. Se são negadas vontades, os pactos desabam e o tempo sufoca. É difícil de aceitar. É árduo prosseguir. Mas, é nesta emoção de derrota inabalável que comete juras inesquecíveis. E neste oceano de devaneios, mal toca na razão. Abandonou a sanidade, esta nunca foi sua. Assim como cada música que insistiu em escutar. 

domingo, 14 de fevereiro de 2021

Ein Tag




Tentei. Tentei por tantos anos fugir das lamúrias que carrego no peito, das marcas do passado cobertas de temor, pânico, dúvida, sorrisos, precisos silêncios enxaguados de incertezas. Ao fechar os olhos, consigo tocar cada coisa de cada momento acabado. O Rei e a Rainha caminhavam de mãos dadas, o céu se iluminava e sabia o que era sorrir. No outrora, tudo que precisava estava ali e tudo que estaria por vir era apenas futuro turvo. 

Nos dias mais cinzentos, praguejo o destino e o vento. Depois, clamo por perdão pelo meu descaso. Na madrugada, imploro para que possa retornar, ao menos um dia, para a outra realidade cintilante. A de minhas fantasias, mas que também era de verdade. Eram tantos encantos e misteriosas sílabas quase cantadas, que mergulhava no universo deles e era feliz, naqueles instantes eternos de contentamento.

O barulho do mar embalava meu sono, junto com as canções recém-criadas. Ao acordar, era atabaque ou o som das risadas que anunciavam que o dia perfeito estava instalado. Não precisava nem levantar para ter esta certeza. Eles a entregavam. Não precisava de mais nada, a não ser que aqueles momentos se repetissem em looping, sem parar. Porque quando se findavam, o medo se fazia presente e os próximos passos eram impossíveis de serem reconhecidos. Num minuto, tudo desvanecia e era a mais infeliz das criaturas.

Contudo, não é disto que desejo falar, não no presente. Agora, não quero pensar no fel que escorria de suas bocas quando eu não era suficiente o bastante para apaziguar as mazelas daquela relação. Não, não é sobre isso. Ao contrário. É sobre a luz que batia no rosto, quando as mãos estavam dadas, quando o oceano banhava os pés, quando gargalhavam de uma piada sem graça. Era quase uma sensação de sonho. Para mim, é impossível conseguir descrever os sentimentos que apareciam, enquanto eu vivia naquele paraíso salgado. 

E eu nunca mais o terei. Talvez seja por isso que hoje eu tenha apenas pesadelos. Não me é mais possível imaginar uma realidade completa sem que estejam por lá. Nada será como antes e eu digo adeus para mim mesma, todos os dias. Quando durmo, quando meus olhos se abrem, quando tomo um gole de água. Porque o hoje, amanhã não será. Porque o ontem está manchado de lágrimas e sangue dos que partiram. Porque sua respiração cessou e metade de mim morreu junto. Porque hoje sou incompleta. 

 


Quando a lembrança é melhor do que a festa

  O sonho banha a memória em silêncio. As cores começam a fazer sentido outra vez. Seu corpo, manchado pela derrota de outrora, insiste em cavalgar em direção do infinito emudecido. Se conseguisse proferir palavra alguma, procuraria recordar os sentimentos do passado. Em um estado eterno de paralisia, se vê perdida em encantamentos falsos. Quando desperta, sussurra os nomes apagados pelo vento.

Bebe desilusão em um cálice cinzento desvanecido. Cobra os afetos perdidos para que volte a sentir o toque gélido da madrugada. A solidão costumeira finca moradia em sua alma. Os restos em putrefação caem em sua face e alimentam as discórdias internas. É de nostalgia que é feita, pois o presente é sempre abominável. É quando revive os erros em sua mente, que a sua rotina é completa.




Em qual pulo deixou de ser quem era? Em qual noite se entregou de vez a desistência? Quando os sábios entoam canções, busca apurar os olhos e compreender onde está a saída tão almejada. Quando há festa em demasia, afasta seus passos para que enxergue melhor a danação de seus dias. Não há retorno ou salvação. Foi na varanda que prometeu ser sua para todo sempre. Depois, apenas descontentamentos cruzaram seu caminho.

Não deveria haver apenas uma solução. Não é possível que não exista possibilidade de resposta diáfana e cristalina. É na transparência que deita a cada anoitecer. Cada frase que lhe pertence é coberta de verdade. Não há entrega pela metade, mas insiste em aceitar fragmentos de sentimentos errôneos e perdidos. As amarras são colocadas por ela mesma, junto com o pranto derramado por anos a fio. Se já sabe todas as sentenças, a amargura deveria ser o último resultado. Mas, é de finais que se alimenta. É da certeza do abandono que se faz.

Os seus erros são baseados no derradeiro número da equação. Testa os limites das afetividades até que possa declarar que sempre soube de tudo. Outra vez, se fecha para frases soltas e aparentemente doces. Mais uma vez, desiste de selar o encontro com o júbilo, pois tem fé na sua inexistência. Assim como os pássaros hão de cantar no amanhecer, seu suspiro final será precisamente confidencial. Com as lágrimas secando, olhará para o horizonte iluminado e proferirá o nome prometido.