sábado, 27 de novembro de 2021

Donnerstags


 

A coragem sempre a acompanhou. Em cada passo, nunca deixou de desaguar as palavras que moravam em seu peito. Em todos os abismos, pulou, sem certeza alguma. No hoje, ensolarado e cheio de recordações, tem certeza de que os erros e acertos do passado vieram para que soubesse quem é e o que deseja, quando a canção toca e os devaneios começam a cobrir a pele. 

Por isso, quando avistou o seu olhar, ligeiramente, naquela noite, já sabia que não havia escapatória. Assim, depois, o coração descompassado começou a acelerar a cada encontro. Estes não eram em si especiais e somente delas, mas, ao menos, podia ouvir sua voz e contemplar a sua face. Entre desfiladeiros e sentenças pronunciadas, buscava compreender estes sentimentos confusos, que brotaram de um momento duvidoso.

Depois, mil cartas confirmaram a sua versão e queria acreditar com todas as suas forças que o Universo a estava guiando para uma jornada resplandecente. Contudo, ainda não sabe. Não há resposta alguma do outro lado e passou a acreditar que jamais terá. Não enquanto os pés não pisarem no mesmo chão. Todavia, o que fazer quando precisa de qualquer sinal de reciprocidade para continuar a acreditar nesta história? Era para existir um sinal, não era?

Qual seria ele então? Os olhares para os outros? A ausência de qualquer vestígio de interesse? Como não desistir se não faz ideia do que está fazendo com a melodia que invadiu sua vida? A razão se esvai e jura para o vento que já não pode prosseguir com esta tolice. Porque é isto, não é? Uma fantasia estúpida que não entende. A sua pulsação acelera, a respiração falha, sente-se atordoada e tonta, mas por qual motivo?

Talvez, a outra ache graça e ria consigo mesma, pensando no absurdo de tal sentimento. Talvez, seja tão risível para ela, que nunca tenha parado para pensar sequer na tola menina apaixonada, que escreve confissões em sua página pública. Sim, como queria que fosse segredo se gritou para todos os cantos do mundo que havia se encantado pela borboleta radiante? É tudo tão confuso e até bobo que prefere parar a escrita até que tenha uma saída mais nítida para este labirinto que ela mesma criou.

Afinal, poderia ter ignorado estas emoções e seguido para outro rumo. Mas, não. Tinha que tentar, se expor e travar uma batalha com o invisível. Agora, não sabe como prosseguir e permanece em um estado quase de transe. Enquanto o cotidiano continua, enquanto elabora projetos, resolve problemas, abre os olhos de manhã e se protege com uma pilha de trabalhos. Mas, o anoitecer chegará e com ele todas as mesmas sensações.

No entanto, são apenas mais três noites, não é mesmo? Antes que possa fugir e se distrair. Até o dia em que estarão respirando o mesmo ar. Lá, neste futuro não tão distante, irá vislumbrar a melhor opção de caminho. Ou, assim espera. Porque é isto que tem feito por meses, certo? Esperar, esperar, esperar...

sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Na mesma terra


Mergulhar no seu beijo e saber que a existência completa faz todo sentido, era apenas isto que queria. Em sonhos, já vislumbrou todos os cenários possíveis. Nas madrugadas, os olhos insistem em ficar abertos. Quando avista o seu sorriso, seu corpo afunda na cadeira e quase perde os sentidos. Mas, é difícil de compreender de onde brotam todas estas sensações tão intensas. Parecem sem sentido, todas estas emoções correndo pelo sangue, se espalhando pela alma.

No entanto, precisa lidar com o fato de que talvez seja tudo ilusão, mas uma ilusão tão doce, que a mente navega dentro da promessa do encontro. Quando será e como será, ela deixa para o Universo responder. Somente o tempo dirá quais os passos certeiros desta danação tão nova e descabida. Talvez, tudo soe como mais uma de suas histórias insanas. Talvez, esta seja mais uma de suas narrativas flamejantes, que se desfazem como pó, quando a realidade bate na sua porta.

Todavia, como viver pela metade? Nunca soube. Se sente o horizonte resplandecer quando escuta sua risada, por que fugir? É preciso encará-la de frente para descobrir o que o destino reserva, quais os tons são melódicos, se há, afinal, alguma correspondência. E, se não houver, também já deixou o coração avisado. Não será a primeira vez que escutará o não, depois do sim. Nem a última. Mas, dentro destas palavras confusas, como achar as sentenças corretas para explanar uma jornada ausente de coerência?

Poderia descrever as razões para tal encantamento. Poderia soletrar cada verso escrito em seus cadernos secretos, que possuem uma lista infinita de poesias baratas, que havia perdido o costume de realizar. Poderia, além de tudo isso, rogar para que todes compreendessem que não existe lógica por aqui. Não há uma gota de racionalidade quando o assunto é a revoada das borboletas. Não tem confissão alguma que consiga abarcar a explicação para tal acontecimento.

Se conseguisse simplificar, reduzir toda a complexidade desta nova canção, diria somente que a pulsação acelera, os batimentos parecem que vão explodir, a tontura se instala e o resto é puro delírio. E do outro lado? Silêncio. Som algum emitido. Os motivos são desconhecidos, mas, no fundo, sabe as razões. Não adianta investigar nas cartas aquilo que se tem quase como uma certeza. Existe um castelo dourado, inalcançável. Nele habitam diversos muros extensos e intransponíveis. Jamais conseguirá passar por estas barreiras.

Ainda assim, irá tentar. Ainda assim, deixará que a tolice a domine. Ainda assim, não abandonará a caminhada. É necessário respirar o mesmo ar, escutar os mesmos sons, para que, em seguida, saiba o rumo certeiro para o qual se encaminhará. Enquanto os pés não pisam na mesma terra, segue pacientemente. Segue em busca de um sinal, de qualquer pista, para que possua a convicção de que não está sozinha. 

sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Eludir

Ela é fogo que se alastra nas madrugadas silenciosas e gélidas. Ela é flâmula que ascende em cada amanhecer e entardecer. Em todos os instantes, seu sorriso gruda na memória, seus olhares permanecem fixos no pensamento e nada é mais importante a não ser a sua voz imponente. 

É difícil saber como encerrar uma história inexistente. Mais ainda, é saber que a noite chega e seu corpo reage ao encontro, sem que possa controlar as suas sensações. Por isso, ainda que sonhando em fugir para o outro lado do mundo, para que não tenha que encarar a verdade, reflete sobre este desejo que é tão dominante.

Quando foi que tudo começou mesmo? Talvez, tenha sido no instante exato no qual a viu. Consegue recordar com detalhes os sentimentos emergentes e desproporcionais ao avistar a sua figura resplandecente. Inclusive, recorda, de forma vívida, a aparição de um pensamento certeiro em sua mente, naquele momento específico.

Sim, o de fugir, o de não prestar atenção. Assim, seguiu, com o foco quase inabalável, procurando construir a trajetória sonhada. No entanto, ao mesmo tempo, em cada minuto que passava, seu coração palpitava sem controle. Algumas vezes, falhava, até, em guardar para si como aquela figura lhe arrebatava.

Eram elementos apaixonantes tão incontáveis que foi quase desistindo de lutar contra o impossível. Mas, seguiu firme na batalha de tentar disfarçar e esquecer esta insana emoção, que não contava com justificativa alguma a não ser uma imagem encantadora. Talvez, isto seja o suficiente para alguns e, para outros, seja motivo de espanto. 

Já não faz ideia do que é apropriado ou não. Também cansou de criar guerras inteiras consigo para evitar sentir o incontrolável. Ao mesmo tempo, tem certeza de que este só pode ser mais um de seus devaneios insensatos e que falta pouco para ele sumir de vez. Falta um tantinho para terminar a caminhada e seguir em busca de outros horizontes. 

Todavia, seguirá melancólica, é bem verdade. Em suas descobertas mais recentes, sentiu um punhal cravado no peito e não faz ideia de como retirá-lo. Como esquecer? Como compreender toda esta equação borrada? Nem em seus sonhos mais infantis e tolos, imaginou que pudesse ser correspondida.

Então, por que driblar ou tripudiar? Por que revelar este segredo? Por que não guardar trancafiado na torre mais alta de seu castelo de ouro, em seu reino celestial, com seu rei e suas alegrias? O que resta agora a não ser dúvidas e questionamentos? O que sobrará ainda deste estilhaçado coração, no final das contas? 

É assim que percebe que as perguntas não são para a outra e sim para si mesma. Ela nunca fez parte desta história, desta fantasia estúpida. Não concretamente. E se existe neste céu infernal alguma resposta, minimamente, pronta, que encontre o mais rápido possível. Há de haver paz nesta revoada de borboletas invisíveis. Há de haver. E repete baixinho esta sentença, até que acredite de uma vez.


segunda-feira, 8 de novembro de 2021

Quando o silêncio acabar

 



A sonoridade de seu nome ecoa em seus ouvidos. A luz de seu sorriso ilumina o horizonte resgatado. No entanto, quantos dias irão passar até que possa revelar o segredo que já é tão óbvio? Poderá arriscar desaguar em seu céu, sem que ouça escárnio em formato de sentença ou duras palavras adormecidas? 

O pulo está preparado, mas não o coração em retalhos. Se ao menos chegasse o sinal prometido, saberia que os devaneios não são tão devaneios assim. Contudo, as madrugadas cessam e as certezas se desfazem. No outrora, era mais fácil de acreditar. Sem se mover e apenas observando, conseguia fingir que não ouvia sua voz porque não havia tentado.

Agora, após tantos meses correndo em sua direção, sem êxito, não faz ideia de como prosseguir. A coragem persiste, porém se sente tola e burra dentro destes rompantes de atitude. Deseja despejar todos os sentimentos guardados em quase um ano de enamoramento. Quer olhar em seus olhos e revelar toda a profundeza e insanidade destas emoções transbordantes. 

Mas, e depois? Em seus abismos criados, sempre o mesmo fim é alcançado. Sempre o mesmo som. Sempre a mesma mágoa. Seu intuito não é fugir, mas encarar. Todavia, as consequências serão colhidas e não terá escapatória. Mesmo assim, ainda que haja um não ecoando em seus ouvidos, terá convicção de que ao menos tentou. Ainda que precise encarar o que virá após a revelação, não deixará de falar. 

Nesta contradição, entre ser completamente quem é e dosar as margens da impulsividade, luta para aguardar a finalização da jornada, para que possa se libertar, finalmente, do silêncio condicionado.