sábado, 21 de novembro de 2015

Blooming

 Havia desistido. Estava mais do que na hora. Seus passos apenas guiavam os dias para a profunda solidão. Com a ajuda do vento, seguia cambaleando. Corria do tempo e buscava compreender quais seriam as melhores respostas. Fugia do barulho das vozes do cotidiano. Respirava, buscando encontrar as soluções concretas para não desabar.

Foi assim. Com os olhos quase fechando. Quando a palavra esperança era apenas utopia. Quando seu sorriso havia se desfeito. Quando seu coração estava quase petrificado. Foi assim que surgiu. É bem verdade que tentou escapar mais uma vez. Tentou negar que os pedaços de sua alma estavam sendo recolhidos. Tentou. 

Porém, a leveza de sua aura contaminou o cotidiano amargo. Porém, já consegue novamente enxergar as cores. Agora, outra vez, pode desejar que venha o próximo anoitecer. Agora, o amanhecer ganha novos significados e já não interessa mais os motivos pelos quais um dia foi tão infeliz. Já não importa. Foi na primavera que encontrou acalento. Foi numa tarde ensolarada que as decisões mudaram seu destino.

Volta a sonhar. Tolamente. Quase delirando de júbilo. Deixando-se levar pelo som daquela voz. Embriagada de certezas puras. Tonta e consumida pela necessidade de encontrar seu olhar. De gritar para o mundo que entregou as chaves de uma vez só. Velozmente. Sem pestanejar. Sim. Pulou desesperadamente para o abismo. Pulou completamente. O mais rápido que pôde. Sem delongas, sem relutância, sem lutas.

Agora o som retorna. O jardim floresce. As luzes se ascendem. Agora mergulha na sua pureza. Nos seus gestos. Nas suas palavras adocicadas. O sentido da escrita regressa. As emoções renascem. Deixa os sentimentos contaminarem suas palavras. Entrega-se vorazmente. Esquece o outrora melancólico. Segue firme. Até o infinito. Até que o presente escorra de suas mãos. Até o último segundo de sua existência. Até o derradeiro suspiro. Até.


domingo, 15 de novembro de 2015

Si Jamais tu m'écoutes

Desespero. Desespero eterno. Dessa madrugada sem fim. Dessa falta de ar. Dessa fumaça que queima a garganta. Dessas escolhas que faz quando o céu se apaga e as memórias se esvaem. Talvez precisasse de alimento para sua escrita, para sua alma. Seus dramas são apenas seus. Não pertencem a ninguém. São tão seus que somente machucam a sua pele. 

Se disse sim foi porque toda sua alma respondia. Resplandecente. Cheia de alegria e certezas. Cheia de sinfonias coloridas e alegres. Cheia de sim. Contudo, sua estrada é tortuosa demais. Seus olhos ardem. Seu corpo treme. É angústia. É angústia sem fim. É. Sem motivos específicos. Sem ao certo saber as razões concretas para tal sentimento. As emoções afloram e as vibrações internas corroem a aura. As palavras se reduzem.

Talvez ainda seja menina. Essa negação, essa vontade voraz de crescer, impede que caminhe livremente. E esse drama eterno que acorrenta suas ações já não lhe é necessário. Quer fugir de prantos, de dores, desamores, intensidades, cores. Quer respirar fundo e seguir. Deseja intensamente a liberdade. Clama insanamente pelo sossego. Por decisões simples. Por caminhos repletos de quietude. 

As lembranças consomem seus pensamentos. Enquanto a água salgada escorre na pele, tenta encontrar algo para se apoiar. Tenta achar alguma lucidez. Busca incessantemente por uma resposta concreta. Busca e delira. Busca e suspira. Busca e recorda. Procura. Obstinadamente, determinada em descobri qualquer solução eficaz para essa amarga sensação de que seu futuro escapou mais uma vez de suas mãos, de que suas decisões já não são mais suas, mas do destino. Desse destino infeliz e perverso, que jamais lhe presenteia com a tão pedida paz.

Não. Não tem respostas. Para ninguém. Muito menos para si. Uma onda de amargura toma conta de seus pensamentos. Uma enorme e profunda onda, que arrasta todas as suas forças para um lugar no qual não existe possibilidade de alegria. Que não há como regressar. Está presa, não está? Sufocada. Atormentada. Infeliz. Ainda que considere suas emoções ingratas. Ainda que tenha certeza de que o vento retornou. Ainda que todos os seus pedidos tenham sido escutados. Ainda que agora deveria ser o momento exato de caminhar tranquilamente. Ainda assim.

A única certeza que permanece é a da vista turva. Embaçada pelo pranto do final de noite. Pela neblina do início de um tormento perigoso. É temor. É preocupação. É tudo. Menos abrir os olhos e enxergar que, na verdade, deveria ser tudo ao contrário. Na verdade, não tem direito de reclamar. Na verdade, deveria grudar na face esse sorriso que aprendeu a usar na infância. Na verdade, deveria só dizer sim. Esperar amanhecer. Parar de se arriscar. Parar de gritar para o mundo todas as suas verdades. Parar. Parar de uma vez por todas. Somente isso. Parar, até silenciar de vez a sua própria existência.


Torcer

Foi. Ainda na primavera. A cautela escapou das suas mãos. Seu coração descompassado achou que seria certo seguir em frente. Seu coração tolo e embriagado guiou seus passos para o abismo. 

O que fez mesmo com as chaves guardadas? Por acaso não compreendeu que a solidão ainda é o melhor remédio para se proteger das impulsividades? Ainda não entendeu que olhos se abrem no amanhecer e a canção já é outra?

Não existe mais varanda alguma que possa guardar seus segredos. Não existem mais jardins que deixem seguros seus devaneios. 

Estava escondida. Em sua torre de cristal. Nas doces montanhas. No silêncio. Nas fantasias. Nas ilusões. 

O perigo mesmo, este que se apresenta em cálices coloridos, está na entrega. Ou nas vozes. Ou nos dias. Ou na espontaneidade. Ou em imaginar que há controle total das ações. 

As palavras são tolas. São em vão. São tudo. É uma escrita para o futuro. Ou não. São muitas perguntas. Muitas questões. Olhares. Pedidos. Promessas. Tudo é tão turvo que já nem consegue mais respirar. Ou ouvir os pássaros. Eles pararam, não é mesmo? Novamente.

Talvez eles saibam a hora de parar. Até eles se entregaram para um mundo sem som, sem cor. Enquanto aquela que ouvia suas músicas grita para o mundo vil suas fragilidades. Seus descontroles. Suas necessidades. E já é não é mais menina. Faz tempo. Aliás, faz bastante tempo. Agora é madrugada cinzenta. É sofreguidão sem propósito. É esse mar que se mistura na tempestade de um sorriso perdido. 

Afinal, quantos clamores precisará escutar para parar de vez? De uma vez só. Completamente. Ou será que os ciclos continuarão se repetindo? Ou será que as dúvidas somente calam quando se dá o último suspiro? Ou será que é melhor pular? Pular de vez. Sem muito pensar. Sem questionar coisa alguma. De alguma forma seria o ideal. Talvez. Assim seria mais fácil. Seria menos doloroso. Egoísta, porém, menos doloroso. 

Essa intensidade juvenil compromete os rumos da jornada. As narrações se repetem. Entre passado, presente e futuro. Entre tempo e destino. Entre decisões concretas e insanas. Entre dizer sim ou sair correndo em direção da noite mais fria de todas. Entre aceitar e desistir. Entre ser inteira e ser pela metade. 

Completa ou não, o melhor mesmo é correr em disparada ao horizonte coberto de resposta singelas. Ou parar tudo de uma vez. Se calar. Ser apenas silêncio, música e solidão. Abandono total da dor. Sem pestanejar. Sem piscar. Sem suspiros. Sem emoções. Sem medos. Sem dúvidas. Sem descobertas. Sem nada. Apenas consigo. E a noite. E a fumaça. E as músicas.

Talvez. E só está começando.