sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Quando o néctar foi fel

É na amargura eterna dos dias que enxerga a salvação. É no canto sinistro do amanhecer que encontra sossego. É no olhar enlameado de descrédito que compreende os próximos passos. É na solidão que decide o rumo da jornada. São neles, nos dias impuros, que reconhece sua verdadeira face. O regresso já é entendido quando aceita que sua torre é feita de fel que escorre da alma. Que é puro veneno tomado em véspera de desespero.

O aviso sempre é certeiro e fiel. Se há a impossibilidade de corresponder mares revoltos tão sinceros é porque já houve um momento de luta interna, na qual apenas a derrota foi invicta. Se agora verte sangue dentro do coração descompassado é porque existiu um dia iluminado para lhe provar que pouco importa a ordem da rima, se no final do verso o mesmo zunido de caos ressoa em suas palavras. Não foi de agora que descobriu a incapacidade de alcançar o final de um horizonte perdido nas fantasias do passado. Não faz muito tempo que sentava na varanda pensando no próximo pulo obscuro.

É, é bem verdade que as sombras lhe são muito caras. É, é bem verdade que tentou escapar como pôde. É, todas as suas falhas tentativas foram em vão, pois quando as luzes se apagam e a noite chega, deita nos braços da inquietude, relembra escárnios vividos, desiste de existir e espera apenas os olhos abrirem e constatar que é dia outra vez.

Porém, por que ainda escreve em versos o que apenas sonatas melódicas podem descrever? Por que ainda deixa que outra música toque quando o desafino é a única certeza até o seu último suspiro? Por que tem tanta certeza das respostas e ainda assim gasta todas as suas energias em perguntas tolas e ventanias sem propósito? Por que abre os abismos se jamais será capaz de pular da forma correta?

Porque há sim uma maneira acertada de pular. Nunca descobriu ao certo. Apenas recolheu retalhos de dor e goles suaves de fim de festa, enquanto mais um trago de fumaça se fazia presente na soma dos dias finitos. 

E deixa que tudo fique sem resolução. E deixa que sentenciem seu destino. E deixa que o desgosto habite sua vida. E deixa que larguem sua mão, rumem para novos espaços, que decidam de uma vez por todas se o sim depois do não vale mais do que qualquer sinfonia mal acabada.


terça-feira, 28 de novembro de 2017

Wind wehen

Foi na varanda, não foi? Ali que tudo começou. Todo esse caos que agora brinda com a madrugada o pacto que fez com sua pele de menina. O veneno, que dos seus olhos correm, dança pela carne amargurada. O pranto é a mais nova corrente que enxágua os passos de sua jornada. Transforma em prosa os escárnios vividos e grudados na memória. Corre em direção do amanhecer em busca de soluções inesgotáveis. 

Porém, não há resposta concreta quando o coração petrificado amolece. Ainda que pudesse acertar a dívida com o vento, não poderia jamais finalizar o débito com o passado. Esse que insiste em lembrar que a noite chega e a solidão não parte. Esse que é dor lancinante em véspera de descaso. Este infinito rubor da covardia anunciada. 

É porque dói somente de pisar naquele terreno que um dia foi sonho. É porque não consegue mais reunir forças para andar quando a memória entorpece os sentidos. É porque a ventania é escassa quando seus pés tocam aquele chão outra vez.

Maldito seja aquele espaço danoso. Aquela aura incendiada. Aqueles sorrisos impuros. Aquelas manhãs impróprias. Aquelas frases murmuradas, aquele jardim, aquele silêncio. Malditas sejam as escolhas profanas ali tomadas. Ou os goles quentes de tempestade e as marcas cálidas deixadas pelos covardes que naquele lugar moravam.

Pior ainda seria dizer que o retorno foi fiel. Pior ainda seria tentar reconstruir o impossível. Mais sincero é seguir, apagar a melancolia, recomeçar e pisar firmemente. Deixar que a música toque bem alto e não se abale. Deixar que o corpo sinta o chão chegar, sem que as verdades sejam escondidas. Dançar até que os pássaros carreguem seus restos e continuem a vibrar com a aurora perdida. Sossegar. 


segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Sommer


Enquanto procura respostas, segue a madrugada incessante. Enquanto não possui certezas, adia os movimentos certeiros, as cantigas melancólicas, as dores eternas, os dias nebulosos e os oceanos que insiste em derramar. Evita não por querer. É bem verdade que já tentou outras vezes. É bem verdade que o ritmo latente de seus passos contaminaram um pouco sua alma cansada. 

Não eram essas as palavras corretas para estarem empilhadas. Não era essa música que gostaria tocar. Ou seria mais um infinito perdão dentro da culpa? Ou seriam seus olhos fechados para o caos que amargurou seu peito e apagou as luzes da varada? Ela ainda existe, a varada. No entanto, não há mais como retornar para aquele lugar um dia tão caro para o coração, hoje quase petrificado.

Não, não é essa a verdade. Por que mentiria se apenas jorra verdade? As questões são demasiadamente amplas e complexas para serem discutidas em uma escrita tão singela. 

É simples porque é o que pode oferecer. É escassa porque o sagrado segredo de sua existência fica guardado na torre, junto com as chaves. Talvez tenha se tornado o que temia, ou talvez seja tão somente um pouco de drama para celebrar a noite solitária. 

Nunca foi tão rápido, correto? O labor das palavras impressas, os batimentos acelerados, o céu em festa. Nunca soube corretamente como expressar o significado de emoções tão banalizadas pelo cotidiano cinzento. Parecia-lhe mais ágil e prático silenciar as vontades e pensamentos, seguir adiante e pular o momento de chegar ao horizonte, apenas se jogar em um abismo sem fim, no qual apenas os sinos tocam e os pássaros caem desfalecidos.


 Contudo, não habita mais em sua lista o desejo de cair. Agora deseja apenas uma estação. Agora todo o caos cessa. Agora, quando escuta sua voz, ela possui todas as verdades que moram no Universo. Agora quando põe os pés na terra, todos os sentidos se afloram. Agora é paz, serenidade e sossego. Agora é rima em vão, porém em sinfonia melódica. Agora é o toque celestial da ventania que lhe pertence. Agora é um sorriso meio sem jeito que reluz juntamente com o sol que lhe foi presenteado. 


sábado, 7 de outubro de 2017

Nectar e fel



Precisa sempre começar por algum lugar. Dessa vez foi o passado que manchou a glória candente de um horizonte que parecia resplandecer. Entre um desatino e outro, busca um gole de respiro, de júbilo, de salvação. Porém, quando seus pés estão próximos do abismo, as torres sobem e trancafiam as emoções puras e doces. A danação está em sua jornada. Seu coração é cinza e danificado pela fumaça que sopra junto com o vento gélido da madrugada.


Por que não pode ser diferente? Por que o destino insiste em entoar canções impossíveis de serem finalizadas? Ou as questões mais reais, concretas e problemáticas são as suas escolhas? Seu olhar inocente é marcado pelo profundo amargor de ser quem é. No final, é uma soma distinta que possui o mesmo resultado.


Ela odeia essa canção descompassada que insiste em fincar morada na alma esmaecida. As lágrimas, outrora derramadas na varanda celestial, secaram junto com as certezas e com a verdadeira face da solidão. Não há escapatória. A soledade está impregnada em sua pele. Mesmo que corra velozmente dos tormentos da desilusão. Ainda que fuja solenemente das torturas das longas frases melancólicas, são os prantos ressequidos que merece. São apenas eles que recebe. 

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Não deveria ser tão árduo. A verdade é que seriam águas cristalinas e reluzentes. Um orvalho adocicado. Um alvorecer singelo e purificado. Mas, aponta em direção do devaneio, das metáforas incompletas, das noites sem fim e pouco seletas. É tolice em demasia e um punhado de final de festa. É porque sabe que falta pouco para escurecer de vez as esperanças singelas de alegria. Sem mistério algum, termina sua junção de palavras mal acabadas. Perde a consciência e segue. Até o último e derradeiro suspiro. Até. 



segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Alvorecer

Quando foi mesmo que amanheceu o dia? O vento soprava forte e já era certeza a despedida. O caos dominava a noite, assim como a madrugada era cinzenta e fria. O tempo mostrara como dominar certos sentimentos e emoções. Porém, os relógios pararam e tudo foi música novamente. Quando as sensações pareciam estar adestradas. Quando as certezas estavam equilibradas. Quando tudo era sereno, cheio de monotonia interna. 

O tempo congelou por alguns segundos. As pupilas insistiam em dilatar quando fitava seus olhares. 

O coração descompassado agora gargalha das palavras escritas. O júbilo reascende na alma e as promessas se desfazem com o nascer do novo horizonte. Os andares da torre inalcançável começam a ruir. Respira. Suspira. Começa outra vez. Porque as frases estão mal posicionadas, como a sua mente que gira sem parar.

É porque não consegue parar de sorrir, enquanto a melodia passa por suas mãos. É porque o soar dos sinos cessaram. É porque já consegue enxergar os pássaros voarem sem tormentos. Porque é leveza sutil e sem escárnios. Porque é poder correr em direção do abismo sem ter medo. Contudo, ainda segura os passos. Contudo, não cai de uma vez só. Observa atenta a aurora se pôr, os mares correrem por seus pés, tendo a certeza que as palavras abençoadas estão marcando lentamente sua trajetória.

Não era para ser entendido. Ou era? Os acontecimentos escapam da memória, mas o que importa realmente é o retorno. Ou o beijo selado, os dias iluminados e o regresso candente das sensações outrora escondidas. É para silenciar, não é? É para calar os ímpetos adormecidos. Porém, a face enrubesce, as canções se alastram e o restante é apenas poeira espalhada pelos caminhos ainda não traçados.  


domingo, 13 de agosto de 2017

Sonntag


Todos os dias são domingo quando a solidão não é mais escassa. O adeus é eterno e sepultado. Seu horizonte dissipou-se juntamente com o último pedido orquestrado em tom de poesia. 

Mas não foi atendido, foi? Porém, o que de fato importa quando o último suspiro faz a noite se findar e o adeus é inevitável? Quantas faces são necessárias revelar até que seja justa a despedida? Porque os relógios irão girar. É impossível parar a chegada do próximo presente que estar por vir.

Afinal, quantos sentidos podem caber em uma frase para compor uma canção destruída? Desabar-se em pratos já não é mais possível quando os olhos secaram e a alma foi consumida pelos dias caliginosos. Não resta muito da sinfonia partida ou das lembranças estilhaçadas. O seu heroísmo desmoronou na curva do ascender da maturidade. 
 
Todos os caminhos parecem apontar para a falta de sentido e cá está buscando uma resposta onde não há. É impossível obter certezas dos silenciados. É inevitável o encontro parco com o fim amargo quando a música cessa e a voz se cala. 

É madrugada infinita. Ou talvez seja um daqueles dias iluminados, banhados de sol. Aqueles que parecem eternos e entediantes. Ou talvez seja melancolia cinzenta trancafiada na torre mais alta do subconsciente amargurado. 

O encontro é certeiro e fiel, o abandono também. Este é marcado apenas pela memória que um dia será destruída junto com as suas verdades. Não há segredos escondidos em sua face. Apenas crisântemos sem perfume. Apenas um resto apodrecido. E o fel, que desce agora na garganta, é também o futuro daqueles que estão por vir. Sobra apenas o palor e a vontade langorosa de seguir. 

 
Quando os pássaros voam eles calam a noite coberta pelo silêncio. O alívio é só uma pausa para o derradeiro clímax. É festa em tom de descaso e o postimeiro suspiro desafinado. É o ecrã vazio e terminado ou a promessa desmantelada em um final de tarde. Ou o desespero, vindo da melancolia, de desconhecer os desafios sublinhados na nova face que ardia. 

domingo, 2 de julho de 2017

Gewinnt



Ela era apenas sonho numa multidão de olhares. Enquanto sua existência se desvanecia diante da presença de tantas outras coisas, cantava para segurar as emoções. Se ao menos soubesse se aquilo era real ou não, poderia afirmar com toda certeza que seus dias deveriam ter se extinguindo faz tempo. Ou não.

Ela era feita da felicidade e dos gestos desmedidos. Enquanto a outra se afogava em melancolia. Ela era caos em pura festa. Enquanto a outra morria em solidão. Ela era toda a reunião de cânticos melódicos, enquanto a outra era apenas disco arranhado. Sabe aquele clichê profanado? Pois então, o era sem saber.

E nessa dança eterna de fuga insensata, respirou e viu que não havia uma saída concreta. Nesse ritmo insano preferiu parar para que não se queimasse novamente porque sua pele já era estampada de vexames marcados pelo outrora despudorado. Esse que gargalha enquanto ela verte uma lágrima de dor.

Sabe aquelas escritas guardadas? Sabe aquelas incertezas da juventude? Sabe aquilo que um dia foi tão profundo que agora parece risível? Sim, esse amontoado de entulho sepultado. Esse que já não é digno de existir. Esse tudo que parece imóvel e em vão. Esse que a deixa sem avisar. Esse ser insensato que avisa que hora de parar imediatamente e só suspirar e entregar de uma só vez a derrota.

Claro que é mais fácil. Porém, o que fazer agora que se sente tão suscetível ao erro? O que fazer quando as fichas foram lançadas e apodrecem no chão? Quando os olhos se fecharam e apenas as mãos se tocam e já é tempo de renunciar.

É sim. E é doloroso sim. E é inconcebível, sim. E nunca mais repetirá seu nome ao não ser que precise entoar versos fraternais. Ou seria apenas drama da madrugada que confunde as certezas? Na dúvida permanece em silêncio. Na dúvida roga para que esteja errada. Na dúvida, cambaleia ébria nas torres que um dia desejou queimar.

Se segura, pois é hora de abrir os olhos. Não mais enxergar o paraíso que um dia lhe pareceu tão jubiloso. E agora sabe. Os dias são feitos de fel e o final próximo de chegar.

sábado, 1 de julho de 2017

Saideira

 Foi, não foi? Para acabar de vez com essa canção insuportável que insiste em tocar. Acabou, não foi? Sua música intragável insiste em soar. Seus passos sempre foram enlameados de caos. Num sábado qualquer, de nostalgia e luto, não seria diferente. Entre um suspiro e outro, o alívio de estar viva e a dor em saber da finitude dos horizontes banhados em cristal de ilusão. Se algum dia pertenceu ao hall dos inocentes, foi banhada em seu próprio sangue que desintegrou qualquer esperança.

Talvez nunca tenha existido. Talvez os desenganos tenham chegado ao limite. Ou será que a porta se abre em todos os momentos em que o ar lhe falta e é preciso abrir bem os olhos para não se enganar mais uma vez. Seus clamores se tornam inaudíveis quando a memória pesa e já não consegue recordar o tom de sua voz. Já não existe lembrança da última rima insensata. Já não há mais fulgor que lhe baste ou aqueça o coração.

O abismo petrificado sorri ironicamente e deixa a valsa ecoar em sua mente confusa e abalada. Se ao menos pudesse recobrar os sentidos e ir em direção do que acreditava ser seu. Se ao menos soubesse como ressuscitar as sagradas promessas que lhe foram um dia tão caras. São secretas, não são? Todas as canções precisam de uma nota final. Aquela derradeira cifra na última linha da partitura. 



É inútil tentar insistir quando as páginas em branco se findaram e o resto é certeza maldita. Quando o caos se encontra com o silêncio em sua aura escurecida é como se o mar profundo dos olhares esmeralda possuísse a luz mais candente de todas e sufocassem sua vontade de prosseguir.

Não é mais possível achar uma cura para tal maldição. A preocupação com as frases incompletas e a solidão tardia da sua história roubaram-lhe os sonhos e os desejos apaixonados. Quando o sol se põe e é somente noite, todas as fadas escutam suas súplicas desesperadas. Mas o dia amanhece e é hora de recobrar os sentidos outra vez. O tempo esconde a ventania e com ela morrem as vontades resplandecentes. 

Tudo cinza. Sem cor. Sem viço. Somente palidez, frieza e terror submisso. É tudo que correu a vida inteira. E agora se desfaz das almas sorrateiras. Fecha os olhos e toma o último gole da saideira.