sábado, 20 de outubro de 2012

Neblina


 Em sonhos, em delírios sublimes, em tempestades seletas, a ventania vem e o coração dispara. Os olhos brilham e se encontram. As escolhas são as ideais. As memórias são deixadas de lado e o presente é feito de mágica. Suspiros eternos em busca do ar. 

O despertar de um sentimento morto se finda quando a música cessa e vem o último trago do cigarro. O clarão do amanhecer não chega em sua turva visão. Nega oportunidades e esconde-se em precipícios de afazeres. Prende-se. Acorrenta-se. Retorna para a masmorra que já não parece tão escura. Jaz na imensidão das lembranças.

Sorrisos imersos na tranquilidade recorrente. Traça o melhor caminho que pode. Trava batalhas pelo o que acredita. Sela pactos. Crava a lealdade e a honra em seu ensanguentado coração. Transforma-se naquelas palavras ditas ao vento. Agora se torna o que pensava ser e não era. Lança-se na ventania da sinceridade, derrama toda a verdade, queima as mentiras cotidianas. Defende aqueles com que divide ou dividiu alguma jornada. 

A lua brilha e reconhece suas feições. Conversam outra vez. Os lugares, os mesmos lugares. Repetem-se ações, emoções, gestos. Ainda assim, existe a surpresa do reencontro, das mudanças, das horas que se passaram mergulhadas na distância. Recuperam-se os sentidos. Abandona o espaço, regressa para as cores secretas, apaga-se a dor e refaz seu canto. 

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

E se fosse...?


Subiu na direção do vento. Correu para encontrar uma resposta perdida nas chamas cruciais da razão. Soluçou em meio aos prantos deixados no passado nebuloso. Carregou incertezas relevantes até o final da jornada. Cercou-se de esperança indesejada. Pulou do precipício incendiado.

Relvas cinzentas nasciam daquela jazida. Flores morriam desvanecidas. Calor transparente, preso em vão na alma candente. Rubra face desprotegida calava o temor rejuvenescido. Tênue semblante da sorte entregue aos pulsos imersos em cortes. Fervor, tremor, súplica inesperada. Amarga cada palavra jogada aos mares da solidão não perdoada.

Plácida. Pálida. Cinzenta. Equilíbrio suprimido em tardes soturnas e desesperadas. Calma. Sorridente. Deixa a angústia latente se despedir enquanto recorda o júbilo de ser quem no outrora era. Deixa que a saudade escorra da memória, dispersa sensações, queima verdades escondidas num subconsciente translúcido.

Dedica sentenças, recorre aos julgamentos, livra-se da culpa, envolve-se na fina emoção de abandonar qualquer purificação, na tentativa de não se apegar. Rompe laços interrompidos, renega mentiras, não mais as escuta.

Caminha leve. Mais uma vez procura a ventania. Responde através das escolhas recorrentes. Um pouco mais dessa cálida pulsação e arderá até o fim. Sempre o encanto vem do fogo, das melodias nascidas em brasa. E deixa tudo queimar.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

O outrora especial

Algo especial... há algo de especial nela, pensou. Olhou para seus olhos e quis mergulhar naquela sensação ininterrupta de felicidade. Tentou recobrar o fôlego. Só de pensar naquelas belas palavras que saiam de seus lábios o corpo delirava. A luminosidade dos versos encantava a cada instante. O coração disparava quando o beijo era selado.

A alma rebelde cansava, mas ainda não era tempo de enjoar. Os passos eram leves. A memória guardava o melhor e foi ela quem trouxe a salvação, no momento mais tortuoso e cheio de perdição. Correu para onde o vento levava, naquela direção, no pulsar frenético das horas descompassadas.

Pausa. Era o momento exato de acordar. Um sopro, sua voz se tornou inaudível. Somente a lembrança restou. Então, como uma tempestade finita, a aurora resplandeceu e viu novamente a paixão desvanecida. A rapidez de um encontro e, outra vez, a partida. Tentou acalmar o ébrio coração. Depois vieram outras distrações.

Fugiu de tormentos, deixou o pranto secar, reconstruiu o caminho pausado para viver o que tivesse de ser vivido. Seguiu, ainda que mantivesse contatos não respondidos. Até que...até que seu caminho cruzou novamente com o dela. Uma noite, uma canção e mais loucuras para serem presenciadas.

Cessou, parou, congelou. Na madrugada, após dizer não para um beijo, tudo pareceu fazer sentido. Nada mais restava naquela história. Pelo menos não como antes. Naquela exata hora, a alma gélida ficou, a pulsação frenética desapareceu. Restou apenas uma sensação estranha. Um resquício de algo irreconhecível. Não é paixão, muito menos amor. Tantos clichês para resignificar e explicar tolices de uma ação sem sentido.

Agora, a decisão parece turva, porém esta não pertence somente a ti. Olha mais uma vez, tenta recordar o que no outrora parecia reluzente. São outras emoções. Talvez. Não sela mais pactos. Não procura entender. Não quer mais nada além do sossego de ser e reconhecer quem é. E o que foi já não importa. O tempo dirá qual o melhor destino a percorrer. Cala-se. Já é hora de dormir e esquecer os dourados fios que cobrem a singela melodia, quase translúcida...e a narrativa vai se apagando...enquanto outra surge.