segunda-feira, 12 de março de 2018

E se fosse poesia?


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Nos dias transformados em pó, o que resta são as amarguras cinzentas de um passado tardio e a vontade de ser o que outrora já fora apagado. Era para regressar e entoar canções que profanassem o passado. Era para ser uma jornada equilibrada e não mais banhada de fel. Era tanto que já não poderia negar o sossego de não ser mais. Era pouco, por isso lhe foram deixando em pedaços, enquanto gargalhavam no golpe final. 
A madrugada já se foi, repete. Precisa acreditar que não existe mais ventania que cure um sorriso perdido. Encontrou as sobras do que fora, sim. Encontrou o resto de gente que ali habitava. Foi porque cada um arrancou um pedaço de sua existência e nada ficou. Foi porque dilaceraram suas verdades, corromperam seu coração, silenciaram a sua alma.

Quando chegou, não tinha mais como respirar. Não tem como ressuscitar os olhos de faíscas cálidas que iluminava os céus cheios de luzes. Sim, um dia foi cor e luminosidade. Quando foi isto mesmo? Na varanda, é bem verdade, deixou os últimos suspiros de resistência. Olha pro futuro com um desgosto estampado na cara e a certeza que nada de bom lhe reserva. Com o sabor do que um dia lhe pertenceu. Com a aura estilhaçada. Foi-se.


Último Ato

Ela já está morta. Desistiu de viver quando entrou naquele jardim. Dali para frente era apenas perdição, delírio e escárnio. Depois de ingerido o veneno não encontrou antídoto que pudesse trazer de volta o júbilo e a coragem que um dia lhe pertenceram. Agora, as sinfonias são nocivas e decisivas. Elas ajudam a enterrar o que restou da menina da varanda. Todas tocam juntas, em homenagem ao seu desespero final.

Não. Não será surpresa alguma quando o último tijolo da torre ruir. Não. Não haverá madrugada, fumaça ou gole de lucidez que a façam regressar. Sua alma cansada e seu coração petrificado insistiram por muito tempo. Já não pode mais continuar. Já não enxerga mais aquele horizonte perdido. Restaram as chamas, aquelas dos zumbis arrastados. Eles venceram, não foi?

A sua carcaça ambulante está virando pó. Já pode sentir a terra cobrindo seus olhos - esta que é mais sincera do que as palavras que lhe foram ditas e prometidas, enquanto o sangue pulsava. Porém, tudo será memória, lembrança e serão palavras falsas. Tudo será discurso vazio. Tudo será mentira. Tudo será em vão. Porque desistiram. Lavaram suas mãos.