sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

O confronto necessário


Decide ir em uma nova direção. Nesta estrada confusa e tortuosa, prefere falar de si. Ora, é o que faz sentido, depois de grudar tantas canções na alma. No hoje cinzento, deseja repelir qualquer aproximação.

Nos últimos anos, em meio ao caos e na solidão profunda do isolamento, quis fugir tantas vezes, que acabou encontrando conforto em seu esconderijo. Viveu tempo demais procurando encontrar respostas em sinfonias perdidas, em versos que já se esvaziaram. 

Depois, recorda da varanda, da fumaça e das promessas tolas e juvenis. Se ao menos pudesse regressar ao passado e implorar para a menina do balanço para se proteger, não estaria devaneando em plena sexta-feira à noite. 

Sabe o que aconteceu, de fato? Desistiu de existir fora da sua redoma de labor. Seus interesses são propositalmente impossíveis. Ainda que a última canção seja inexplicável, que tenha se entregado absurdamente para uma fantasia, no fundo sempre soube que jamais iria concretizar suas vontades. 

E o que foram elas, então? Por que somente desperta para sofrer e engolir doses eternas de tormento? Por isso, neste exato instante, trava uma luta consigo mesma e tenta decidir se irá prosseguir com o abandono da borboleta. É isso que deseja falar, na verdade, não é? 

Sobre o medo de trilhar outro caminho, para depois não saber qual será a nova estrada. O recomeço é o mais árduo. O novo, o estranho, o desconhecido. Não quer mirar nenhuma face que não seja a sua. Todavia, jamais possuirá o seu objeto de paixão. 

Por isso, rasga sua pele e procura aceitar convites de novas melodias. Ao mesmo tempo, corre de todas elas. É quase como um filme de terror, no qual todes gritam para que escape, mas ela continua lá, imóvel, apavorada, respirando com dificuldade, esperando um regresso que nunca virá. 

Em seguida, recorda do dia de hoje e toda a devastação que fora contemplar o outrora. Ao pensar no passado, viu-se atormentada por suas ações. De um lado, o princípio de tudo, quando conheceu a suposta deusa em seu trono dito celestial. 

Do outro, o presente da fábula insólita. No meio, cópias inegáveis de abismos repetidos. O nó na garganta vem exatamente disto. Por quanto tempo viverá esse looping eterno? Por quantas vidas tentará escapar da mesma sina?

O final é igual, sempre. Seja agora ou nos tempos que já foram. Em seus castelos, governados por seus donos, escolhem permanecer ali. Não importa de qual face esteja falando. Uma por uma, dia por dia, de estação em estação. 

Elas olham nos seus olhos e dizem que não há como escapar da sua sina lamacenta. Até os lugares parecem os mesmos. Os gostos, as lendas, as decisões… As suas e as delas, dançando no ar e gargalhando da tempestade que é a de selecionar incessantemente o mesmo rumo na bifurcação. 

E já sabe, no presente momento, que está indo no caminho oposto ao que deveria. Correndo, sem olhar para trás, dirá não. Dirá não quantas vezes quiser, quantas vezes forem necessárias. Contudo, somente roga ao destino e a si mesma que quando disser sim, a calmaria venha e não mais a danação. 

Que não encontre nada parecido como antes. Que não suplique, que não sinta tanto, que não se prenda mais aos sorrisos indevidos. Que navegue em mares tranquilos, em narrativas serenas, em horizontes luminosos. Sem escárnio, sem mentira, sem silêncio, sem controle, sem sufocamento, ganhando somente suspiros e algum tipo de paz possível. 

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