
Um grito de dor lancinante e mais um
punhal finca-se nas costas. Neblina. Paixão. Suspiros e gemidos do anoitecer
transformam-se em júbilo despudorado. A escuridão se alastra, o cinza tenta
alcançar seus passos. Uma miragem, uma paisagem, a imagem que insiste em trazer
sussurros inescrupulosos, maldosos, invisíveis, cobertos de escárnios.
Arde na concupiscência, deixa que o
desejo apague as incertezas, redescobre os sentidos verdadeiros. Deixa a doçura
penetrar a alma e o cristalino veneno escorre dos olhos. O ódio motiva. O
amanhecer ainda é fiel. As mágoas se desfazem e soterram-se no oceano revolto
de sua aura. Entrega-se de uma vez só. Sedenta pelo novo caminho que surge em
sua frente, destrói muros de súplicas, enlaça a sorte, abandona a morte passageira
de sonhos translúcidos.
Queima a escrita, derruba a varanda
na qual a mente se prendia, foge das inverdades, denuncia as falsidades, rasga
as sentenças pré-estabelecidas, corrói o resquício de pranto, permanece na
sobriedade dos dias, nas metáforas concretas, nas palavras indiscretas, em tudo
que pode ser e jamais foi no outrora distante.
Sela pacto com a justiça, aceita as
promessas do destino, incendeia o tempo, renega a melancolia. Candente, rubra e
preenchida de força jamais sentida. Fecham-se as cicatrizes, deleta os
infelizes corvos que tentam derrubar o impossível. Espera e segue rumo ao
pedestal certeiro das horas desvanecidas. Perde-se para nunca mais, naquela
bruma sangrenta e revolta, entre as flamas e os lírios, entre o início e o fim,
entre o agora e o eterno. Na intensidade das flores, nos acertos sem pudores,
em tudo que for festa em demasia.