domingo, 6 de março de 2011

Miragem

   Sempre imaginei quem seria aquela garota na varanda. Com o cabelo deslizando com o vento. Inebriada pela fumaça que tanto a pertence. Contando os minutos para se libertar da prisão que fora acometida. Aquela que só estava em sua mente. Tão cheia de pudores e palavras não ditas.
    Sem misericórdia ela abandonou o que aprendeu. Foi dominada por um outro lado. Coisas nunca imaginadas foram feitas por ela. Arrependimentos causados. Um certo nojo de si apareceu. Assumindo um novo ser dilacerou limites e entregou-se as vontades. Deixando todos os ensinamentos. Todos os dogmas recitados em sua vida.
     Agora, começo a reconhecer a garota. Enxergar um novo horizonte. Novas metas. Não há príncipes que chegarão correndo para resgatá-la. É preciso ser um pouco mais forte do que pensava. O escolhido só existe em sua imaginação. Em delírios ecoados ao mar de dúvidas. As canções afirmam que existem amores inesquecíveis. Sim, eles existem. É só abrir os olhos e acordar.
    Com a realidade batendo em sua porta, apaga todo resquício de infância. Da meninice. Que tinha. Ainda é cedo para falar. Porém, sem esquecer que deixou de lado qualquer esperança de bondade. O veneno escorre pelas veias despedaçadas. O desejo pulsa. As lágrimas secam e não há mais garota alguma que tome conta dela.
     O mundo a deflora. Possuída de prazeres jamais vistos por ela. A donzela desprotegida se despede para um futuro novo. Cheio de flamas. De novos significados. Sim. Afirma tanto para que possa ser dona de si. Para que possa ter o que quer tanto. Aquela boca. Que sussurra. Aqueles olhos que brilham. Que pedem por mais um gole do intenso gosto proibido.
     Na varanda. Outra vez. Com a fumaça. Leal. Que a destrói e salva. Com lembranças de uma noite puramente alucinante. Com os medos ainda sendo superados. Com tanto ao redor clamando para retornar. Esquece tudo. Todos. Ignora os fatos. Ainda que isso seja fugir um pouco da realidade. Há ainda um pedestal. Contudo, quem disse que ela não gosta de desafios? É para isso que está aqui. Para ser desafiada. Para ser contaminada pelo toque. Por impropérios. 
      Sufocada pela própria imagem. Sem ar. Lendo cada linha várias vezes. Voltando aos poucos para o céu. Iluminado de recordações. Suspira. E jamais regressa ao meu estado.

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