quarta-feira, 10 de agosto de 2022

O rio dos seus olhos



O rio dos seus olhos é como um poema no qual o desejo é se afogar e jamais retornar para a superfície. O calor de sua alma se espalha pelos campos floridos, cobertos de girassóis. A profundidade de suas emoções, elevam a potencialidade de sua companhia e o coração fica em festa apenas pelo deleite que é estar ao seu lado. Os segundos preciosos insistem em passar e a despedida é cada vez mais dolorosa e intensa. 

Os sinos badalam alto - ao seu redor e em sua pele - e o amanhecer liberta, mas a memória aprisiona. Qual foi a última vez que sorriu tão verdadeiramente que todos os pássaros voaram em perfeita combinação? Não há ali um passo planejado, um tom performado. Nenhuma palavra proferida foi tão sincera como neste encontro selecionado pelo destino. Nunca fora tão feliz, tão pura de intenções, tão inundada de emoções cristalinamente generosas.

A nova pessoa que emerge a cada olhar dela, sabe que não deve modificar elemento algum desta provável amizade. Reconhece também que lutou por meses inteiros e infinitos para que não fosse verdade, para que não estivesse se apaixonando por aquela figura quase celestial. Mas não, não irá colocá-la em seu pedestal reluzente que estava desocupado, não é sua intenção imaginá-la como um ser angelical, sem imperfeições. 

Pelo contrário, fita a sua face e reconhece o que há de melhor ou não, porém também possui a certeza de que jamais avistou mulher alguma que guardasse consigo uma coleção de fatores que somente sonhou um dia encontrar. No entanto, não era para ser assim, jamais planejou que fosse desta maneira, nem em um milhão de anos poderia pensar que viveria algo parecido. Contudo, a sua escrita não precisa ser tão apegada ao real, aos fatos concretos. Ela pode ser sobre a beleza de seus gestos ao colher framboesas e amoras. 

Pode falar também da suavidade de sua voz quando relembra de situações intensas de seu passado ou como a sua atenção não vacila quando está realmente interessada em escutar uma história. Mas, também poderia descrever como seu tom pode ser assustadoramente firme ou como a quebra de alguma expectativa transforma seu semblante e a afasta. Todos estes elementos compõe alguém apaixonante sim, alguém que imediatamente a faz imaginar como seria se Bach e Mozart escrevessem juntos uma sonata. Talvez fosse exatamente como ela: cheia de ventania e brisa suave, um sol que queima, mas cura.

Se fosse ficção, ela seria personagem complexa, seria um riacho, que vira sua corrente sem ao menos avisar, seria a noite estrelada, que se cobre de tempestade inesperadamente, seria o plot twist, o cliffhanger, a gag criativa, a puchline. Todavia, ela é real, não é narrativa. Por isso, se segura forte para fugir deste sentimento tolo, que a domina nesta manhã de quarta-feira. Procura encontrar forças para se reconstruir no período de sua ausência. De certo, irá apagar esta sensação nas próximas semanas e esta espécie de paixão será esquecida completamente. 

Assim, respira e confia no tempo, na maturidade de suas emoções, no foco de seus propósitos, nas viagens, nas novas árvores que irá abraçar, nos parques, nas andanças de bicicleta pelos campos da nova cidade que ocupa, nos livros, no trabalho, em tudo, menos nela. Há de passar, há de existir uma alvorada na qual sua presença carrega apenas o real e não o imaginário. Então, aguarda até que seja futuro e seja completa de novo.

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