Não sabe. Não consegue. Não enxerga. É tudo muito turvo
quando a madrugada incendeia e resta apenas um gosto amargo. Tenta medir
palavras, controlar vícios. Busca um tanto de lucidez para analisar os últimos
tempos. Suspira. Se perde nas questões infinitas. Ressuscita lembranças e
temores, dilacera relações.
Ainda que
tentasse, jamais seria capaz de encontrar a doçura eterna, leves palavras. Sua
boca é feita de fel que arde na alma. Seus dias são danações sinceras, porém
cruéis. Suas lágrimas, nunca finge, porém, marcam o reinício do ciclo. Este que
insiste em petrificar sua aura. Este que condena sua existência. Gostaria de
puder contar uma história fixa. Contudo, não é capaz. Não consegue. É
impossível.
Entre cortes
de sentenças mal ditas, procura explicar suas ações. Aí que está o engano. Não
há ouvintes. Não há justificativa. Não há explicação. Somente angústia. Somente
a fuga do júbilo e a solidão. O engano. A impureza dos atos. As incertezas. As
paixões perdidas e apagadas. Não há salvação. Não há coração que possa limpar a
jornada tão tortuosa. Como encontrar um horizonte há tanto tempo perdido? Como
respirar suavemente quando sua própria existência sempre foi marcada pela
dúvida.
Se ao menos
pudesse.... Se...
Mas não. É
preciso reconstruir seus passos. O cotidiano relembra. O tempo continua a
correr. As vozes escapam de suas mãos. Apenas resta o sacrifício. O pranto. O
impossível. E a fumaça. E mais danação. E a sagrada verdade presa em seu peito.
Aquela que quer gritar e nem sabe por onde. Aquele que queima até o último
suspiro. Aquela que dói. Machuca. Acalenta, porém não salva. Porque é por
alguns instantes. É tudo tão efêmero que nem pode tocar. Antes desfalece. Antes
recorda dos pecados. Antes lembra dos erros. Do que perdeu para respirar. Do
que nunca pode dizer. Do que nunca será capaz de alcançar.
E no medo,
na dúvida, no esquecimento, deita. Permanece e se instala. Se joga do primeiro
abismo que encontra. O primeiro toque de luz singelo. A primeira verdade
profana. A primeira mágoa endossada. Se joga até que se afogue. Pula até que
seja impedida. Pula infinitamente. Até. Para todo sempre. Até nunca mais. Até
que seja. Até que se finde. Até que pare. Até.